Na manhã da quarta-feira, 8, o delegado da Polícia Civil do Paraná (PCPR) de Pontal do Paraná, Jader Roberto Ferreira Filho, concedeu coletiva à imprensa no departamento da PCPR em Curitiba, onde ressaltou a conclusão do inquérito policial sobre o desabamento de laje ocorrido em 22 de março de 2024 em um supermercado no balneário Canoas, causando a morte de três funcionárias do estabelecimento e deixando 12 pessoas feridas. O proprietário da construtora, o dono do supermercado e o proprietário da empresa contratada para administrar a obra, foram indiciados pelos crimes de três homicídios culposos e lesões corporais. Além disso, na coletiva, o perito da Polícia Científica do Paraná, Luis Noboru Marukawa, trouxe detalhes do trabalho pericial realizado no desastre, onde foram constatados diversos erros na execução da obra na laje que desabou, incluindo “gambiarra” e capeamentos menores do que o projeto necessitava, entre outros itens.
De acordo com o delegado da PCPR de Pontal do Paraná, Jader Roberto Ferreira Filho, o inquérito abrange denúncias de crimes de três homicídios culposos e 12 lesões corporais culposas. “A questão das lesões corporais serão aferidas no decorrer do tempo, pois existe uma vítima que ainda está um pouco acamada, a gente não sabe o grau e não sabe se voltará a andar ou não. Em relação aos três homicídios culposos, sim, três indivíduos, três figuras, de acordo com os seus os seguintes substratos das suas responsabilidades serão formalmente indiciados por homicídios culposos”, destaca, ressaltando que serão indiciados por homicídios culposos o dono da construtora, o proprietário do supermercado e o dono da empresa contratada para administrar a obra.
“Até o momento, a Prefeitura de Pontal do Paraná não respondeu o ofício da Polícia Civil no qual requisitou a apresentação do alvará de funcionamento”, ressalta o delegado, ressaltando que “no que se refere ao órgão municipal seria um alvará de licenciamento, como todo e qualquer empreendimento tem que possuir e não tinha”, destaca. “A Polícia Civil entende que o dono do supermercado, assim como o responsável por administrar a obra foram imprudentes em inaugurar o empreendimento sem a documentação necessária, sem a menor sombra de dúvida”, explica Jader.
Sobre a possível presença de autoridades municipais em cerimônia de inauguração do supermercado, ao ser questionado em coletiva, o delegado respondeu que “não cabe à Polícia Civil verificar esse tipo de análise, a PCPR investigou a questão da criminalidade ali enxergada nessas três figuras. A questão de autoridades públicas que estavam estarem ou não em evento não cabe à Polícia Civil fazer qualquer análise neste momento”, complementa.
Imprudência e negligência
“No caso do dono do empreendimento, acreditamos que ele foi imprudente por ter inaugurado o supermercado de forma prematura, ter inaugurado sem a licença, inclusive o protocolo de solicitação de alvará não foi movimentado, ele foi movimentado no dia da tragédia, causando uma certeza estranheza. O dono da empresa contratada para administrar esta obra, no ver da Polícia Civil, foi negligente, há relatos de testemunhas que houve vazamento no dia que estavam limpando, a caixa d’água foi enchida no dia e essas informações, pelo que até agora nós colhemos, não foram levadas em consideração”, afirma o delegado Jader.
Outra informação repassada pelo delegado foi com relação às diligências realizadas pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia – Paraná (Crea-PR) no caso e o engenheiro responsável pela obra e possível perda de seu registro profissional. “Se ele foi negligente, foi imperito na realização do seu trabalho, sim, mas até o momento não há elementos informativos suficientes para imputar a responsabilidade, a não ser essas três figuras”, destaca.
Perito detalha problemas constatados na obra e desastre
“Baseado nos levantamentos do exame pericial feito pela Polícia Científica do Paraná, nós constatamos efetivamente um erro na execução na montagem das peças estruturais da torre daquela edificação. Nós encontramos diversos erros que estão constantes no laudo pericial que possui quase 200 páginas, mas dentre eles eu posso citar, falta de grauteamento de peças estruturais entre vigas e pilares, nós temos gambiarra onde foi colocado madeira para preencher um espaço vazio entre pilar e viga. Também temos ali a questão do cobrimento da laje, chama-se capeamento, com uma especificação menor do que em projeto, do que no cálculo, que era para ser de 10 centímetros, nós apuramos que variava de seis a oito centímetros”, afirma o perito criminal da Polícia Científica do Paraná, Luis Noboru Marukawa.
Segundo ele, no capeamento sobre as lajes pré-moldadas protendidas “existia uma tela, uma armadura, que deveria ficar sobre as lajes e avançar sobre a viga, aumentando, portanto, a resistência do bloco único da laje, porque até então, quando se coloca uma laje, ela tem uma resistência a cargas, quando você coloca todas, você faz a equalificação, chaveteamento, adequadamente ela passa a funcionar como um bloco único e, com isso, pela falta da espessura do capeamento ter sido menor do que em projeto de cálculo estrutural, pela falta de armadura sobre a viga, fragilizou aquela laje, que infelizmente não suportou, portanto, a carga. Não que o projeto memorial de cálculo estivesse errado, a execução não foi adequada”, esclarece o perito.
Água que caiu da caixa pode ter salvado vidas
Sobre os erros constatados e possibilidade deles ocorrerem devido à economia de valores da obra ou simplesmente por equívocos de cálculo, Marukawa explica que “quando se faz a construção, a execução da obra, existe um engenheiro responsável para acompanhar o processo na construção civil, inclusive ele assina uma ART, uma anotação de responsabilidade técnica, assumindo o que está fazendo”, destaca. “O colapso começou no terceiro piso, com a viga voltada para a frente da rua. Então as caixas d’água tombaram na hora que a laje desabou, atingiram a viga, deixaram as suas marcas de sulcagem e a água proveniente desta queda, provavelmente salvou vidas, porque quando a água cai daquela torre em grande volume, nós temos a energia potencial na Física, ela desce, adquire velocidade, aumenta a energia cinética, e quanto atinge o solo, ela empurra as pessoas que estavam próximas. A água deve ter poupado vidas também durante o desabamento”, complementa.
“Fizemos um comentário adicional que consta no laudo com relação à falta de documentações, mas é só para ilustrar o nosso trabalho com relação ao que entendemos da falta de um documento ‘habite-se’, de um alvará do Corpo de Bombeiros, ele era um vício oculto, portanto, em qualquer vistoria feita pelos órgãos competentes de segurança, eles não seriam visualizados, porque estava encoberto por concreto, impossível de se constatar visualmente. Então, tendo o alvará ou não, iria desabar”, detalha o perito.
Segundo ele, a perícia foi feita nos quadrantes onde a queda de laje ocorreu. “O restante da edificação não foi periciada, então não sei como ela está, não foi motivo de trabalho da Polícia Científica. Onde ocorreu o desabamento as peças foram retiradas, mas ali existem duas peças que ainda precisam ser retiradas com auxílio de guindaste, seria uma viga que ela rotacionou em torno do seu eixo longitudinal durante a queda, e ela está presa por outra placa de fechamento lateral. Então, não é recomendável ficar ali embaixo. Até onde sei, eles farão a retirada das suas peças, mas é necessário equipamento adequado, entre eles um guindaste com capacidade de carga para retirar as peças”, finaliza , Luis Noboru Marukawa, ressaltando que os trabalhos periciais foram concluídos no local no começo de março, com posterior coleta de dados para fazer o trabalho e as possíveis causas do desabamento.