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Entrevista

Promotor aborda evolução histórica do casamento na sociedade

“A sociedade vai, ao longo dos séculos e anos, passando por transformações e o casamento e a forma de casamento acabam sendo um reflexo dos princípios e valores da época”, ressalta o promotor Alessandro Almeida (Foto: MPPR/Comunicação)

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Alessandro Bettega Almeida explicou garantias legais do casamento e união estável

Assim como a sociedade, o casamento evoluiu no decorrer dos séculos e anos, com diferenciações entre o aspecto civil e religioso, bem como concessão de garantias legais para o casal. Nessa esfera, o promotor de Justiça, Alessandro Bettega Almeida, do Ministério Público do Paraná (MPPR), abordou mudanças recentes na lei para garantia da proteção dos adolescentes menores de 16 anos, bem como garantias legais dentro do casamento e da união estável, bem como as alterações no conceito do matrimônio no decorrer dos séculos, com uma visão atual mais plural de família. Confira: 

Folha do Litoral News: Como o senhor observa a evolução do casamento na sociedade?

Alessandro Almeida: A sociedade vai, ao longo dos séculos e anos, passando por transformações e o casamento e a forma de casamento acabam sendo um reflexo dos princípios e valores da época. Por exemplo, na época de Roma, na esfera do Direito Romano, o casamento era considerado uma união entre o homem e a mulher por toda a vida, na sociedade divina e protegida juridicamente. Era uma união, naquela época, para toda a vida, em uma unidade divina que interessava a Deus, havia um aspecto religioso muito forte. Passam-se alguns séculos temos a Revolução Francesa e, após isso, há a elaboração do Código Napoleônico e os valores desta época estabelecem que o casamento é uma união entre o homem e a mulher para perpetuar a espécie e sob a proteção do Estado. Veja que aqui continua a história do homem e a mulher no interesse da procriação dos filhos, o que era importante para a sociedade na época, sob a proteção estatal, aqui a questão de Deus é retirada do ordenamento, algo que reflete a sociedade da época. Esta foi uma mudança em que esses valores se espalharam para todo o mundo, principalmente no ocidental. As coisas vão, eu não digo evoluindo, pois depende do que a pessoa acha que é uma evolução ou não. As transformações existem. Hoje, na própria França e o Brasil, o casamento é considerado entre duas pessoas, não necessariamente de homem e mulher. No Brasil, o casamento continua sendo, desde a Proclamação da República, uma questão somente do Estado, não é uma questão religiosa, é o chamado casamento laico.

Folha do Litoral News: Com relação à Lei Federal N.º 13.811 e a mudança recente que passou a proibir o casamento entre pessoas com menos de 16 anos em qualquer caso, qual a sua análise?

Alessandro Almeida: A ideia é a proteção dos adolescentes. Anteriormente funcionava de forma que qualquer pessoa para casar tinha que ter 18 anos, mas ela poderia casar com 16 anos com autorização dos pais. Essa nova lei estabelece o seguinte: com menos de 16 anos em hipótese alguma você pode celebrar um casamento, tem que ter 16 anos. Antes dessa lei havia exceções que era a de quando havia diante da relação do casal a gravidez e quando havia imposição de pena criminal. Nessas duas situações era possível que a idade núbil sofresse uma flexibilização, que fosse quebrada, em que, por exemplo, a menina com 16 anos que engravidasse poderia casar, inclusive com um menino com menos de 16 anos. Hoje, com a nova lei, fica proibido este tipo de casamento. Há um lado interessante que demonstra que a lei muda, mas não gera tantas consequências jurídicas, porque, por exemplo, por um descuido no processo de habilitação do casamento acaba passando e a menina tenha menos de 16 anos, esse é um casamento que está infringindo uma regra da Lei, que é o artigo 1.520 que foi alterado, onde a consequência disso, na prática, segundo a Lei, é de que se no casamento resultar a gravidez, esse casamento não pode ser desfeito. Mesmo ele feito com uma ilegalidade ele acaba convalidado. E mesmo em um caso que não tenha resultado a gravidez, só pode pedir a anulação do casamento a própria pessoa que casou ou seu ascendente, que é o pai ou o responsável legal. O promotor de Justiça, o Juiz e o advogado não poderão fazer nada. Interessa exclusivamente a pessoa, mas a ideia central é a proteção do adolescente.

Folha do Litoral News: A questão criminal envolvendo este tipo de matrimônio de menor de 16 anos seria em que situação?

Alessandro Almeida: Seria com relação ao caso de estupro. O crime de estupro de vulnerável continua sendo previsto penalmente, só que já havia sido revogado sobre formas de extinção de punibilidade em casos de casamento posterior ou violência sexual. Foram criadas duas correntes, uma delas entendendo que já havia sido revogada que é a questão do crime como causa de impossibilidade de casamento e outra que não. O fato é que com a nova Lei não há mais possibilidade de casar com menos de 16 anos, seja em razão da gravidez ou imposição de pena criminal.

Folha do Litoral News: Antigamente o casamento religioso tinha a mesma validade que o civil, isso ainda vale?

Alessandro Almeida: Hoje casamento é civil. Na época do Império do Brasil o casamento era religioso, após a Proclamação da República, a partir da Constituição de 1891, o casamento passa a ser civil. Mesmo no Código Civil de 1916 ele sempre previu o casamento civil e o Código Civil de 2002 continuou nesse sentido, entretanto há a possibilidade de um casamento religioso ser celebrado e após essa celebração ele ser validado, desde que as pessoas, o casal, se dirijam a um cartório de registro e lá façam todo o processo exigido pela legislação. O casamento religioso pode ser validado desde que respeite todos os requisitos legais para o casamento civil. Ainda que religioso, ele precisa passar por todas as exigências da Lei, o que significa que se você chegar e fazer apenas um casamento na igreja ou templo e fazer celebração, aquele casamento, não estando registrado, não vai valer. 

Folha do Litoral News: No caso de pessoas que estão juntas sem legalizar esta união, existe diferença entre quem se casa oficialmente e quem simplesmente resolve morar junto sem oficializar união?

Alessandro Almeida: Ainda há diferenças no que a gente chama de casamento e união estável. Na união estável as pessoas se unem, querem constituir uma família e efetivamente acabam constituindo. Hoje existe o que chamamos de família plural, são várias formas de famílias que existem, como, por exemplo, a monoparental, onde só há a mãe ou só o pai, bem como o casal tradicional, o casal que separa e casa novamente, o casal homoafetivo que também tem filhos. Hoje temos uma variedade de entidades familiares, mas ainda há previsões no Código Civil que trazem diferenças entre o casamento e a união estável. Recentemente, houve um julgado considerando a companheira ou companheiro, que é quem compõe a união estável, em que na sucessão de bens ele foi equiparado à esposa ou esposo, ou seja, a união estável foi equiparada ao casamento. Entretanto, existem outras disposições, nas quais ainda não há julgado sobre o tema, por exemplo, a outorga marital ou uxória, que é a concordância do cônjuge quando vai vender ou comprar imóvel, dar fiança ou aval: essa é uma regra que existe para o casamento e não existe para a união estável, mas a tendência é que seja estendida esta regra também para a união estável. Sob esta esfera podemos dizer que o casamento dá uma maior segurança para o casal, porque existe este tipo de previsão. Com relação à união estável há a possibilidade de chegar ao cartório ou perante o Juiz pedir o seu reconhecimento, o que é bastante interessante, porque o que a gente vê na prática é que nos casos de união estável geralmente aquela relação não está formalizada e, eventualmente, quando ocorre a morte de um dos conviventes ou a separação, é preciso, antes de prosseguir qualquer processo, reconhecer aquela união, entrando com pedido de reconhecimento de união estável, algo muito comum na prática. No casamento isso não precisa, pois as pessoas foram ao cartório, passaram por processo de habilitação e foram casadas com a certidão de casamento, em que, no caso de morte de alguém do casal ou separação ele pode exigir legalmente, mas na união estável há esta questão que atravanca os caminhos da pessoa. O ideal é ir ao cartório e fazer o reconhecimento da união estável, inclusive prevendo o regime de bens, isso traz menos problemas lá na frente. 

Com informações do MP no Rádio/MPPR

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