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Entrevista

Médica pediatra e infectologista explica como as crianças podem reagir à Covid-19

Mais de 2 mil casos já foram notificados, com 6% de letalidade

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Há cerca de dois anos, a população tem lidado com o enigma de um novo vírus que se manifesta de forma diferente em cada indivíduo. A Covid-19 continua sendo objeto de estudo para médicos e especialistas que a cada momento descobrem algo novo e conseguem lidar melhor com a doença para evitar mais vítimas. Com o início da vacinação para crianças de 5 a 11 anos e o aumento das internações de crianças e adolescentes no Brasil, muitas dúvidas surgem quanto à reação do público infantil à doença.

Muito se falou sobre os riscos da infecção para idosos e pessoas com comorbidades. Mas, e as crianças, como estão reagindo ao vírus e quais complicações são observadas? A médica pediatra e infectologista, Dra. Jaqueline Dario Capobiango, respondeu essas e outras questões para que pais possam compreender melhor o risco da doença e ficar atentos aos sintomas que podem surgir e as formas de prevenção.

Folha do Litoral News: Pouco se falou sobre os cuidados e os riscos de crianças contraírem Covid-19. Fale um pouco sobre os casos que já presenciou e a importância de proteger este público.

Dra Jaqueline: Não há dúvidas que as crianças se infectam e são transmissoras, felizmente até o momento as crianças apresentaram menos casos graves e internação em relação aos adultos, mas isso levou a um descaso das pessoas em relação ao risco de transmissão na faixa etária pediátrica. Vale ressaltar que apesar da proporção ser menor, só no Brasil, mais de 2.000 mil casos de crianças já foram notificados, com 6% de letalidade. Considerando que muitas crianças não são testadas, com certeza o número de casos está subestimado. Atualmente, o que estamos presenciando é um aumento considerável de casos também entre as crianças, pois como ainda elas não estão vacinadas são um grupo vulnerável e que ajudam a manter o vírus circulando. O atraso para o início da vacinação desta faixa etária propiciou o que estamos vendo hoje, prontos atendimentos e consultórios de todo o Brasil cheios, além de aumento de casos de crianças internadas. Porém, mesmo assim, muitas crianças continuam não sendo testadas, mantendo a subnotificação e sem o real conhecimento da magnitude do problema. A internação pela Covid-19 secundária à Síndrome Respiratória Aguda Grave (casos com necessidade de oxigênio) ainda é mais encontrada em lactentes e crianças com alguma doença de base, principalmente doença neurológica, pulmonar e obesidade. Estas têm sido as crianças que ainda correm maior risco de óbito. Temos visto crianças que tiveram formas leves da doença e depois de meses adquirem novamente Covid-19, inclusive com apresentação mais grave na segunda infecção. Portanto, deve-se manter os cuidados para evitar a transmissão para as crianças: não ficar sem máscara perto delas, orientar o uso correto de máscaras para as crianças acima de 2 anos de idade, não levar as crianças a locais fechados com aglomeração, estimular que elas sigam as regras de higiene e vaciná-las para Covid-19. 

Segundo a médica, muitas crianças continuam não sendo testadas, mantendo a subnotificação e sem o real conhecimento da magnitude do problema
Foto: Getty Images

Folha do Litoral News: Quais são os sinais mais frequentes que as crianças estão apresentando?

Dra Jaqueline: A maioria das crianças apresenta sintomas leves e de curta duração, como febre, dor de garganta, tosse, coriza e diarreia. Crianças maiores se queixam também de dor de cabeça e dores no corpo. Algumas crianças apresentam a Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica (SIM-P), uma complicação mais tardia da doença, que aparece entre 2 e 6 semanas do início dos sintomas, quando o paciente volta a ter febre, dor abdominal, queixas respiratórias, comprometimento cardíaco, diarreia e manchas pelo corpo. O tratamento da SIM-P é com medicação endovenosa, e não pode ser atrasado, pelo risco de sequelas e óbito.

Folha do Litoral News: Como identificar os sintomas da Covid-19 em bebês? Quais são os sintomas mais frequentes?

Dra Jaqueline: Os lactentes (menores de 12 meses de vida) costumam apresentar febre baixa, ficam mais apáticos, têm diarreia, às vezes apresentam coriza e tosse frustra, mamam menos e desidratam mais fácil. Alguns também cansam durante as mamadas e precisam de internação para hidratação ou para receber oxigenioterapia, pois a oximetria fica abaixo de 95%. 

Folha do Litoral News: Quais sequelas as crianças que tiveram Covid-19 podem apresentar?

Dra Jaqueline: Depende de qual órgão foi acometido, dependendo do grau de lesão pulmonar ou cardíaca podem ter dificuldade para realizar exercícios físicos. As crianças que têm miocardite (inflamação do coração) podem ter sintomas de insuficiência cardíaca e arritmias. Muitas crianças apresentam miocardite leve, cujos sintomas podem não ser percebidos pela família, em especial nas crianças pequenas que não conseguem falar. Nestes casos podem levar também ao prejuízo de ganho de peso. Em alguns pacientes o vírus afeta o pâncreas, e desenvolvem diabetes, desde o início da pandemia observamos um maior número de casos de cetoacidose diabética em crianças. Além disso, as crianças também podem ter comprometimento da função renal, com manifestações graves como inchaço generalizado. E ainda as crianças podem desenvolver a Covid longa, com queixas arrastadas de indisposição, cansaço fácil, dor de cabeça, dificuldade de concentração e memória, problemas de sono e depressão.

Folha do Litoral News: As crianças que não apresentaram sintomas graves podem ter sequelas?

Dra Jaqueline: Sim, as sequelas graves pulmonares e cardíacas têm sido mais encontradas nas crianças que necessitaram de UTI, porém sequelas menos graves e a Covid longa podem acontecer em todas as formas da doença. A real dimensão da Covid longa, precisa ser definida, pois muitas crianças com Covid-19 ainda não são diagnosticadas. Todas as crianças que tiveram a doença devem continuar em acompanhamento com seus pediatras, pois com o tempo entenderemos melhor as consequências desse vírus (SARS CoV2). Ainda estamos aprendendo com o SARS CoV2, não podemos subestimá-lo.

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