Entendimento é de que barreira sanitária é válida pelo momento crítico da pandemia e falta de leitos na região
Na manhã desta quarta-feira, 17, a Justiça Federal, por meio da 1.ª Vara Federal de Paranaguá, por meio do Procedimento Comum N.º 5011178-23.2021.4.04.7000/PR, em ação de autoria das prefeituras de Paranaguá, Pontal do Paraná, Matinhos e Guaratuba, deferiu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela e concedeu autorização para implantação de barreira sanitária na BR-277 para controle da pandemia de Covid-19 em Paranaguá e no litoral. Segundo a decisão do Juiz Federal Substituto, Guilherme Roman Borges, o controle da entrada de pessoas ao litoral, entre eles turistas, é necessário, devido à situação do sistema público de saúde litorâneo e falta de leitos para tratamento de pacientes com Coronavírus na região. Com isso, a Associação dos Municípios do Litoral do Paraná (Amlipa) fica autoriza a implementar barreira restritiva na BR-277 entre o KM-12, antes do acesso à PR-508, algo reforçado também pela autonomia concedida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) aos municípios para ações pontuais contra a pandemia.
O prefeito de Paranaguá e presidente da Amlipa, Marcelo Roque, destacou a importância da decisão. Segundo ele, o Juiz Federal Guilherme Roman Borges compreendeu “a dificuldade que estamos enfrentando aqui no litoral após o lockdown de Curitiba e Região Metropolitana”, relata. “As pessoas estão descendo ao litoral para se refugiar deste lockdown e nós estamos em um momento difícil, com leitos e Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) ocupadas”, informa. “Voltamos com a barreira sanitária na BR-277 com muita tranquilidade, segurança, com apoio da Polícia Rodoviária Federal. Digo para quem está assistindo de Curitiba e Região Metropolitana: não desçam para o litoral para férias. O momento que vivemos aqui no litoral é difícil. Fiquem em suas residências”, afirma Roque.
De acordo com a decisão, Paranaguá, Pontal do Paraná, Matinhos e Guaratuba, que compõem a 1.ª Regional de Saúde (1.ª RS) da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), ajuizaram a demanda em face da União e da Polícia Federal (PF) do Paraná, pleiteando, inclusive como tutela antecipada de urgência, que os réus não se oponham à instalação das barreiras sanitária na Rodovia BR 277, bem como que seja determinado o apoio da PRF na operação. “Fundamentam sua pretensão alegando, em suma, que os municípios ora autores, que integram a 1ª Regional de Saúde do Paraná, se encontram em situação excepcional em razão da pandemia da Covid-19, sendo necessária adoção de inúmeras medidas para contenção do vírus. Dizem que entre as medidas, foi adotada a utilização de barreiras sanitárias para o impedimento da vinda de turistas ao litoral, haja vista a superlotação do sistema de saúde e também da região litorânea. Assim, a medida foi adotada buscando conter a propagação do vírus, para preservação da saúde dos munícipes”, informa a decisão.
Segundo o magistrado, no âmbito da ADI nº 6341, foi reconhecida a competência municipal para a adoção de medidas restritivas diante da Coronavírus, segundo a qual “a disciplina decorrente da Medida Provisória nº 926/2020, no que imprimiu nova redação ao artigo 3º da Lei federal nº 9.868/1999, não afasta a tomada de providências normativas e administrativas pelos Estados, Distrito Federal e Município”, informa. “Portanto, o próprio Supremo Tribunal Federal (STF) reconhece que os Municípios detêm competência adoção de medidas de isolamento, quarentena, interdição de atividades e serviços diante da realidade do município.
A AMLIPA e municípios reforçam que uma nota oficial foi publicada anunciando a implementação de barreiras restritivas na BR-277, algo que, segundo a associação, foi necessário e urgente, visto o “lockdown” adotado em Curitiba, que “trouxe quantidade massiva de pessoas para a região litorânea, agravando o quadro de superlotação dos serviços de saúde, em razão da propagação do vírus”, detalha. “Por tal razão, se fez necessária a tomada de medidas mais restritivas para o controle da Covid-19”, informa a decisão.
Ponto eficaz para barreira
Segundo o repassado pelos municípios à 1.ª Vara Federal, o único ponto eficaz para controle de acesso a Paranaguá seria na BR-277 entre os KM-12, antes do acesso à PR-508, entretanto a ação foi impedida pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), que detém jurisdição sobre a via, onde foi relatado, em nota da PRF, que em poucos minutos da atividade, a barreira teria ocasiona um engarrafamento e colocava em risco a integridade física e patrimonial dos usuários da via, com risco de acidentes. A Amlipa então afirmou que havia a necessidade de realocação da atividade a um local adequado. “Alega que a barreira foi instalada no mesmo local em que acontecem fiscalizações diárias pela PRF, como blitz e Operação-Verão, não sendo fidedigna, portanto, a informação de que a barreira sanitária causaria qualquer risco à população”, destaca a associação.
Segundo a Amlipa, os municípios possuem competência normativa para adoção de medidas de isolamento, quarentena, interdição de atividades e serviços, conforme a realidade de cada cidade. “Argui que de acordo com a Constituição Federal, por analogia, compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local (art. 23, inciso II e art. 30, inciso I, CF), o que também está previsto no artigo 17, inciso I, da Constituição do Estado do Paraná e no artigo 7º, inciso I, da Lei Orgânica do Município de Paranaguá.
Segundo a ação, a associação destacou que o Ministério Público do Paraná (MPPR), em nota emitida, afirmou que a aceitação da adoção de barreiras sanitárias para conter disseminação do Coronavírus, sem ferir regras de mobilidade urbana, algo reforçado pelo STF na autorização dos governadores e prefeitos para a instalação de medidas de restrição de estradas para contenção do vírus. “Destaca a presença do periculum in mora, haja vista que a quantidade de turistas que irão se locomover às regiões litorâneas, enquanto não houver barreira sanitária, colocará em risco a população e a saúde pública. Assim, requer a concessão da tutela antecipada, para que a União se abstenha de impedir a realização de barreira sanitária na BR-277 entre os KM-12, antes do acesso à PR508, e, no mérito, a procedência da ação com a conseqüente determinação da obrigação de não-fazer por parte da União”, informa o magistrado federal sobre os pedidos da Amlipa na ação, que foi distribuída 3ª Vara Federal de Curitiba que declinou a competência à Vara Federal de Paranaguá.
Decisão do Juiz Federal
“Quanto à questão de competência para analisar o feito, fixo-a neste juízo, a uma, porque a competência da 3ª Vara Federal de Curitiba, especializada em questão de saúde, diz com a prestação imediata de bens da vida relativos à saúde, como medicamentos, tratamento, exames, internações hospitalares etc., o que não é o caso dos autos; a duas porque o objeto desta ação, de fato, é a obrigação de não-fazer e o direito de ir e vir face a Decreto Estadual de lockdown; e a três, porque nada mais bem compreendido que o raciocínio exarado pela ilustre magistrada da Vara que é especializada na matéria”, informa a Justiça Federal.
Segundo a decisão, Amlipa e municípios litorâneos, no que diz com à possibilidade de determinarem medidas restritivas diante da situação pandêmica, não são necessárias maiores digressões. “O STF já se manifestou de modo robusto sobre a competência comum dos entes federativos nestes assunto, sobretudo no julgamento das ADIN’s 6341 e 6343. Portanto, desde logo me manifesto pela plena possibilidade da AMLIPA e seus respetivos municípios- membros estabelecer, de acordo com suas peculiaridades, as restrições ao fluxo de pessoas em direção ao Litoral do Paraná. No mérito, ainda que em juízo perfunctório, vislumbro que assiste razão aos argumentos exarados pelos autores na inicial. Sigo a preocupação exarada pelas ilustres instituições do Ministério Público e Defensoria Pública do Estado e da União”, relata o magistrado.
O magistrado informa que é essencial ao Poder Executivo atuar no enfrentamento à pandemia, com realização e proteção de saúde pública, reforçando o estado de bem-estar social, direitos sociais e Estado desenvolvimentista. “Certamente, em estados federados, ao Poder Executivo Federal esta obrigação desponta, e seu papel centralizador do fluxo dos anseios sociais e executor de políticas públicas alcança um lugar privilegiado e necessário. Todavia, diante do silêncio recalcitrante do Poder Executivo Federal no momento atual, por mais grave que o seja neste último século, parece-me oportuno que os Poderes Executivos Estaduais e Municipais ocupem o lugar necessário na quadratura das funções constitucionais. Melhor seria se a ação fosse coordenada, como em outros lugares estrangeiros o foram, mas não o sendo, parece-me, desde logo, oportuna a atuação dos Executivos Municipais no presente caso, como assim o foi de modo exemplar, embora tardio, do Executivo de Curitiba, com seu Decreto 565/21”, informa a Justiça Federal. “À medida que, como relatado na inicial e como noticiado na mídia, a PRF impediu a realização da necessária barreira sanitária em cumprimento a decisão federal, não está aqui o Poder Judiciário agindo num campo de ativismo judicial, mas tão somente permitindo a implementação da estrutura constitucional tal como o foi prevista originalmente”, relata o Juiz.
De acordo com a decisão judicial, os municípios litorâneos decidiram, por bem, agir, reforçando o texto constitucional e protegendo a população local, visto a situação da pandemia e da saúde pública local, algo repassado à Justiça Federal por documentos comprovando número alto de infectados, internados e de lotação de leitos. “precariedade da saúde pública do litoral, que não é de hoje, certamente se agravou neste momento de pandemia, chegando à lotação máxima dos leitos hospitalares e imensas filas de necessitados de seus cuidados, conforme relatórios. Portanto, parece- me absolutamente razoável a limitação ao trânsito terreste na rodovia desejado pelos referidos municípios. Não se está aqui no exercício de um separatismo, exclusivismo ou qualquer congênere, mas sim, de uma limitação temporária, plausível, sustentada em pesquisas científicas, que pretende momentaneamente impedir que o vírus se dissemine e comprometa ainda mais a saúde local”, informa.
O Juiz Federal destacou como razoável a argumentação feita pela Amlipa de que esta não seria uma barreira total, “mas sim, uma barreira destinada a veranistas ou turistas, apenas com o intuito de desbordar ainda mais a capacidade hospitalar local, que já alcançou seu limite máximo, com a redundância do termo”, complementa. A decisão afirma que a atuação dos municípios é lógica, legal, razoável e constitucional. “Entendo que a medida de barreira sanitária, com exceções, tal como mencionado nesta Nota Oficial, a pessoas a serviço no litoral (caminhoneiros e demais pretadores de serviços); pessoas empregadas no litoral; e pessoas que efetivamente residem no litoral cumpre o juízo de proporcionalidade e se mostra prudente”, informa.
“Restringir que veranistas e turistas, especialmente, possam ir ao litoral do Paraná é uma medida necessária, porque alcança o fim almejado que é a redução da proliferação do Covid-19; é adequada ou conforme, porque não seria possível ser menos lesivo ao direito de ir e vir que não realmente impedir o acesso ao litoral, já que a disseminação da doença se dá por contato entre pessoas; e é proporcional em sentido estrito, porque não se trata de uma limitação total, mas razoável propriamente dita, porque exclui da limitação pessoas que precisam do acesso: trabalhadores e prestadores de serviço, empregados e residentes efetivos”, afirma o Juiz Federal Guilherme Borges.
Ampla divulgação e fiscalização da PRF
O magistrado relata como necessária a implantação da barreira restritiva, com atuação da PRF, que “sempre cumpriu no Litoral do Paraná um papel singular e respeitado”, diz. “Muito embora entenda a preocupação da PRF com os eventuais acidentes e redução de fluxo de veículos por ocasião desta barreira sanitária, não vislumbro consistência em eventual impedimento, haja vista que não foram poucas, ainda que o número possa ter sido reduzido recentemente, as fiscalizações realizadas na rodovia, por blitz e controles de um modo geral, sempre eficazes e com risco de acidentes reduzidos, porque bem elaboradas com o conhecimento que a PRF tem do fluxo local de passagem”, afirma o Juiz Federal.
Determinando a ampla divulgação da decisão, o magistrado federal afirma a necessidade de que todos sejam informados quanto à barreira restritiva, não gastando tempo e recursos para ir ao litoral. Deferindo o pedido de antecipação dos efeitos de tutela, a Justiça Federal determina que “a União se abstenha de proibir, nos termos suso mencionados, a realização de barreira sanitária pela Associação dos Municípios do Litoral do Paraná – Amlipa na BR-277 entre os KM-12, antes do acesso à PR-508”, diz o documento. “A Polícia Rodoviária Federal garanta a realização da referida barreira sanitária, assim como promova a manutenção da segurança dos agentes públicos envolvidos e da população. Determino a ampla divulgação desta decisão, como disposto outrora. Fixo astreinte no valor diário de R$ 10.000,00 em razão do descumprimento desta decisão. Determino a citação e intimação da União para que cumpra a decisão, assim como apresente defesa nos autos, no prazo legal. Abra-se vista ao Ministério Público Federal”, despachou o Juiz Federal
“Retifique-se a autuação, com a inclusão no polo ativo dos municípios de Pontal do Paraná/PR, Matinhos/PR e Guaratuba/PR, e a retificação do polo passivo, para que conste como réu a Polícia Rodoviária Federal, e não a Polícia Federal. Intimem-se com urgência”, finaliza a Justiça Federal.
A decisão é liminar e dela cabe recurso.
O documento na íntegra pode ser acessado abaixo:
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