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Entrevista

Delegada alerta para exposição de crianças e adolescentes

A delegada do Nucria, Maria Nysa Moreira Nanni, atua desde 2014 em Paranaguá atendendo também a casos de violência contra a mulher

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A Rede de Proteção à Criança e ao Adolescente objetiva prevenir e inibir a violência. Infelizmente, apesar de os casos chocarem a opinião pública quando amplamente divulgados, o número de denúncias é considerado pequeno. Um dos motivos pode ser atribuído à falta de preparo da sociedade em reconhecer casos de violência e não saber lidar com tais situações quando já estão instauradas.

Para explicar mais sobre o assunto, a Folha do Litoral News traz uma entrevista com a delegada do Núcleo de Proteção à Criança e ao Adolescente (Nucria) de Paranaguá, Maria Nysa Moreira Nanni, que atua também no setor de Atendimento à Mulher. A delegada é graduada em Direito e tem duas pós-graduações concluídas, em Direito Ambiental e Direito Público e, outra em andamento, na área de Gestão Pública. Após exercer a advocacia por 12 anos, está desde dezembro de 2014, atuando em Paranaguá. O uso da Internet por crianças e adolescentes também foi abordado pela delegada, já que muitos pais têm dúvidas sobre como educar essa nova geração. Confira a entrevista:

 

Folha do Litoral News: Como atua e quais órgãos estão envolvidos na Rede de Proteção à Criança e ao Adolescente Vítimas de Crime? Quais ações são desenvolvidas?

Maria Nysa: O escopo da rede de atendimento e proteção à criança e ao adolescente é conhecer os relatos de necessidades e vitimizações de crianças e adolescentes e esses fatos não precisam, necessariamente, ser criminosos. Necessidades sociais, educacionais e de saúde estão compreendidas. A partir desse conhecimento, pode-se entender a composição da rede de atendimento e proteção que compreende setores da Segurança Pública, Saúde, Educação e Assistência Social. As secretarias de Estado devem sempre desenvolver o atendimento transversal e integrado. Se uma criança, por exemplo, apresenta necessidades de acompanhamento educacional, será atendido inicialmente em sua unidade de ensino, avaliado e é realizada uma análise específica para os encaminhamentos necessários. A partir da definição de atendimento e encaminhamento, a responsabilidade é da família ou responsável legal.

Folha do Litoral News: O mesmo acontece com crianças e adolescentes vítimas de crimes?

Maria Nysa: Sim. Se o conhecimento da condição de vítima da criança acontece na escola, por exemplo, o estabelecimento de ensino deve comunicar o NUCRIA ou a delegacia de sua cidade imediatamente. Quando a notícia do crime chega ao conhecimento policial rapidamente, com mais agilidade são realizados os encaminhamentos para os órgãos de saúde, assistência social e acompanhamento psicológico. E todas essas ações precisam de integração, conhecimento dos servidores públicos e colaboradores para que o desenvolvimento das etapas de investigação, acolhimento e recuperação da criança ou adolescente vitimados sejam eficientes.

Folha do Litoral News: A Internet tem sido uma ameaça à proteção de crianças e adolescentes devido à grande exposição que elas têm no meio eletrônico?

Maria Nysa: Em princípio se poderia afirmar que a Internet agrava a condição de vulnerabilidade das crianças e adolescentes. Entretanto, a realidade estudada através das investigações policiais evidencia que o agravamento da vulnerabilidade dos jovens tem origem no descaso familiar, na falta de orientação e educação para a vida. A vida sempre foi perigosa e as crianças e adolescentes que recebem orientação, cuidados e atenção constantes ficam menos expostos a perigos.

Folha do Litoral News: Em que situações os pais precisam ficar mais atentos para proteger os filhos?

Maria Nysa: A partir do momento em que os filhos nascem. Podemos elencar situações de risco dentro de casa e com a Internet desligada: riscos gravíssimos de morte no interior das residências com acidentes domésticos; ingestão de substâncias tóxicas; convívio com amigos da família que se aproveitam da proximidade para abusar de crianças e adolescentes; espancamento por pai, mãe e familiares; abandono intelectual e material; falta de acompanhamento da evolução emocional dos adolescentes – que os deixa suscetíveis a manterem amizades inadequadas, ingerirem bebidas alcoólicas e entorpecentes. Há uma infinidade de situações que expõem os mais jovens independentemente da Internet. Para o uso dessa ferramenta, recomenda-se que os pais tenham atenção e controle sobre os contatos nas redes sociais, as mensagens que são enviadas e recebidas. Um cuidado que deve existir em paralelo ao conhecimento do círculo de amizades dos filhos.

Folha do Litoral News: A sociedade hoje, na sua opinião, está preparada para reconhecer e lidar com a violência contra a criança? Como ajudar?

Maria Nysa: A sociedade nunca esteve preparada para reconhecer e lidar com a violência contra a criança e é por esse motivo que em 2017, no século XXI, ainda temos sérios problemas com este tema. Em primeiro lugar precisamos mudar paradigmas: a sociedade é violenta, aplaude a violência, convive com violência. Uma sociedade envolvida em violências diversas (agressões e linchamentos por questão de gênero, ou nascidas em boatos, ou apoio à violência contra quem cometeu crime, agressões verbais gratuitas por causa de divergências ideológicas ou de posicionamentos, etc.) não tem como reconhecer uma violência contra crianças.A violência tem como pressuposto a prepotência, a covardia e o medo. É difícil entender a coexistência, na mesma pessoa, da violência (baseada na prepotência, na covardia e no medo) e do amor ao próximo (baseado no respeito, na força moral e amadurecimento emocional). A violência e o amor ao próximo são opostos. Um sempre está mais forte que o outro. Portanto um pai que aplaude a violência, por exemplo, em uma torcida organizada, não tem como ensinar respeito ao filho. Pais que discutem e se agridem mutuamente não têm condições de ensinar respeito conjugal e de gênero aos filhos. Os exemplos são incontáveis. Muitas pessoas na sociedade manifestam indignação em relação a violências contra crianças e adolescentes exigindo punições ilegais para o agressor ou agressores. A legislação já estabelece quais as punições são adequadas. Lutar por justiça dentro dos parâmetros justos pode ser um ensinamento muito mais útil para barrar a violência do que exigir mais violência. E, de fato, para essas pessoas, a vítima fica em segundo plano, servindo como um motivo dramático de justificativa da raiva criada contra o agressor. Sobre a cura das lesões (físicas e emocionais) sofridas, pouquíssimas pessoas se manifestam.

Folha do Litoral News: O comércio ilegal de entorpecentes é considerado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) uma das piores formas de exploração do trabalho infantil. Como você avalia este cenário em Paranaguá?

Maria Nysa: Em Paranaguá não existem dados sobre crianças trabalhando no comércio ilegal de entorpecentes, mas as crianças com pais envolvidos nesse tipo de atividade estão mais expostas aos riscos inerentes ao crime: ingestão de substâncias tóxicas, contato com pessoas inadequadas ou sob efeito de entorpecentes. Há, entretanto, a participação de adolescentes nesse comércio quase na mesma proporção que adultos. Nos casos de adolescentes apreendidos na condição de comércio ilegal de entorpecentes é realizado um boletim de ocorrência circunstanciado e o adolescente entregue aos pais ou responsáveis para então, em data pré-designada, comparecer em audiência perante o Ministério Público, o qual decidirá, conforme o caso, as medidas que devem ser tomadas.

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