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Entrevista

Juíza de Paranaguá aborda a desigualdade de gênero em tempos de isolamento social

Dra. Cintia Graeff abordou os direitos conquistados pelas mulheres (Foto: TJPR)

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Juíza de Paranaguá aborda a desigualdade de gênero

Nos últimos anos, as mulheres conquistaram avanços importantes em vários aspectos e tiveram muitas conquistas na luta pela ampliação de seus direitos. Mas as diferenças ainda persistem. A desigualdade de gênero aparece em diversos campos da sociedade brasileira e a pandemia que assola o mundo pode colocar a luta pela igualdade em risco.

O Programa Justiça Para Todos, da Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar) entrevistou a juíza da 1.ª Vara Criminal de Paranaguá, Cintia Graeff, que abordou mais sobre o assunto. A magistrada lançou, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação de Paranaguá, o projeto “Educação pela Paz: Construindo Lares sem violência”, que leva palestras para as escolas com o intuito de conscientizar as crianças sobre o tema. 

Ela acredita que a chave para solucionar a discriminação feminina, que ainda persiste no País, está nas futuras gerações e na conscientização de homens e mulheres para romper o padrão que vem se repetindo historicamente. Confira:

O que é considerado igualdade de gêneros?

Dra. Cintia: Igualdade de gêneros não diverge em nada quando falamos de igualdade de uma forma ampla. Homens e mulheres devem ser livres para fazer suas escolhas, desenvolver suas capacidades pessoais sem qualquer interferência decorrente de esteriótipos. A igualdade não significa que homens e mulheres são os mesmos, mas que todas as responsabilidades, direitos, oportunidades, tudo isso deve existir para todos, sem restrição baseada no fato de ser homem ou mulher. A gente pode dar o exemplo de empresas, onde homens e mulheres com iguais condições, experiências e formação devem ter iguais condições de concorrer a elevados cargos ou a uma remuneração igualitária. O que ainda não ocorre no Brasil. Mulheres com iguais capacidades recebem, aproximadamente, 24% menos que homens.

Engana-se, então, quem pensa que falar de gênero é o mesmo que falar de sexo ou do universo LGBTQIA+?

Dra. Cintia: A palavra gênero começou a ser utilizada nos anos 1980 pelas feministas americanas e inglesas para explicar a desigualdade e se concretizava nessa discriminação e opressão. Naquela época, as investigações sobre a condição social da mulher apontava já para uma forte desigualdade entre homens e mulheres, e essa desigualdade tendia a aumentar, conforme a classe social, raça, etnia e condições de vida. O termo se refere aos papéis, comportamentos, atividades e atributos que uma sociedade considera apropriado e valorizado no homem ou na mulher. Então gênero é uma categoria do masculino e do feminino, considera diferenças biológicas, reconhece que são distintos, mas não admite que isso seja utilizado como justificativa para a violência, exclusão ou para a desigualdade de oportunidades, seja no trabalho, na educação, na família, em qualquer esfera pública.

Com relação a outras nações, o Brasil é um País com maior desigualdade de gêneros?

Dra. Cintia: O Brasil ainda carrega um forte legado do patriarcado, não só pelas próprias construções sociais, mas também porque o reconhecimento igualitário de direitos tem um histórico ainda muito recente na legislação. As mulheres passaram a ter direito ao voto somente em 1932, há menos de um século, e somente em 1946 que o voto se tornou obrigatório. Até então, as mulheres eram subjulgadas e consideradas incapazes de escolher seus próprios governantes. Somente em 1962 houve o estatuto da mulher casada que garantiu, entre outras coisas, que a mulher não precisava mais de autorização do marido para trabalhar, receber herança e, em caso de separação, ela poderia requerer a guarda dos filhos, o que até então nem isso era permitido. A Constituição de 1988 garantiu a igualdade plena de direitos entre homens e mulheres. Mas, ainda assim, só em 2001 com a rescisão do código civil, é que, de fato, a mulher ganha o poder familiar e igualdade de direitos. Trata-se de uma história muito recente. Ainda temos muito a caminhar para conseguir efetivar o que a lei nos dá garantia. 

A pandemia está colocando a luta pela igualdade de gênero em risco?

Dra. Cintia: De certa forma, o isolamento social pode trazer retrocessos. A gente precisa eslcarecer que a desigualdade de gêneros e a violência contra a mulher estão ligadas ao patriarcado, que remotam desde a época do feudalismo, quando somente o homem era o detentor do poder, tinha participação na sociedade, trabalho remunerado, e a mulher era confinada ao lar. Hoje, com os filhos em casa, pode-se ver que é muito provável situações em que algum dos pais tenha deixado de trabalhar, caso não seja possível o trabalho remoto. Deixar o trabalho representaria um grande retrocesso, a retirada da mulher do mercado de trabalho. Além disso, também tem a situação da violência doméstica, que tem aumentado sobramaneira nessa época de isolamento social.

A senhora acredita que a desinformação ainda afeta os debates sobre gênero e o combate à violência contra a mulher?

Dra. Cintia: Eu diria que é o principal fator, porque ninguém enfrenta o problema se não sabe que ele existe. No Brasil, segundo os últimos dados, são 533 casos de violência contra a mulher registrados por hora. Uma em cada quatro mulheres passou por violência no Brasil em 2018, segundo o último Atlas da Violência. A cada duas horas no País, uma mulher morre vítima de violência. O Brasil ocupa o 5.º lugar no ranking mundial de feminicídio. Mulheres são mortas e agredidas a todo momento pelo simples fato de serem mulheres, e mesmo perante tamanha brutalidade há muitos que tratam da violência de maneira irresponsável. Isso certamente é fruto da desinformação.

Fonte: Programa Justiça para Todos, da Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar) – A entrevista na íntegra pode ser conferida aqui: https://www.amapar.com.br/images/mp3/JPT28092020.mp3 

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