O dia-a-dia é marcado pela necessidade constante de dar respostas a respeito de nossos interesses, gostos, metas e situações pessoais, inclusive sobre nossa religião. Tais respostas podem até se tornar dados de uma estatística. Contudo, a pergunta sobre religião requer uma resposta mais profunda e menos imediata. Ela nos questiona sobre o porquê somos ou não membros de uma comunidade religiosa. Ela diz respeito ao modo como nossa corresponde ao que professamos. A isso pode ser luz o Evangelho deste Domingo: Mateus 16,13-20.
Jesus pergunta a seus discípulos sobre a fé, que deve ser diferente das meras opiniões dos outros a seu respeito. Ele passa de um genérico “Quem dizem que eu sou?” para um questionamento pessoal: “Para você, quem sou eu?” A resposta não tem em vista uma curiosidade estatística da parte de Jesus, mas explicitar a relação existencial da pessoa com ele. Portanto, ainda que possa parecer, a resposta não é fácil.
O tempo foi criando imagens e caricaturas de Jesus: o juiz universal que condena e, por isso, amedronta; o todo-poderoso que resolve cada um dos nossos problemas materiais, normalmente isentando-nos de duras responsabilidades e compromissos; o misericordioso que aceita tudo e não cobra nada e nos deixa tranquilos em nossos pecados… São vinte séculos, portanto, de imagens, fórmulas, devoções, experiências, interpretações que marcam a pessoa de Jesus que chega até nós. Essas situações todas podem tanto revelar como esconder a grandeza de quem ele é. A esses dados históricos acrescentam-se as nossas próprias projeções, desejos, aspirações e interesses em relação a ele. Desse modo, quase sem perceber, diminuímos e desfiguramos a sua pessoa, inclusive quando sinceramente desejamos exaltá-la.
Por isso nos interrogamos: o que poderia ajudar no descobrimento de quem é Jesus para nós? Temos à nossa disposição dois grandes auxílios: a Bíblia, especialmente os quatro Evangelhos, e o testemunho dos cristãos e das cristãs de ontem e de hoje que seguiram a Jesus Cristo de verdade, deixando-se transformar por ele, demonstrando a fé por seu modo de viver. Pedro e Paulo sintetizam os dois auxílios. Pedro proclama a sua fé messiânica em Jesus: “Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo”. E recebe uma missão, ser “rocha” sobre a qual Jesus mesmo edificaria a sua Igreja. Paulo, fazendo a experiência do encontro com Cristo Ressuscitado, considera lixo todas as suas glórias, diante da grandeza do conhecimento de Jesus Cristo. Ao final de sua vida, testemunhou: “Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim. Minha vida presente na carne, eu a vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou a si mesmo por mim” (Gl 2,20). Ambos deixaram-se transformar por Cristo e por ele deram a vida no martírio.
A pergunta continua válida para os homens e as mulheres do nosso tempo: “Para você, quem sou eu?” E cada qual, dia após dia – vencendo a tentação de criar um Jesus à sua imagem e semelhança, para satisfazer suas necessidades –, irá descobrindo quem ele é iluminado pela Bíblia e pelo testemunho dos santos e santas. A meta é, pois, aceitar Jesus de todo coração como Salvador e amar o Pai e a todas as pessoas como ele amou. A oração transformará tudo em relação amorosa e pessoal, sem a qual a resposta permanecerá racional, mas não existencial.