Crônicas

Zequinha

O plano de saúde teve aumento. Quase tive uma síncope com o valor do IPVA. Estou aqui às voltas com uma série de pendências para resolver, boletos para pagar e, ...

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Zequinha

O plano de saúde teve aumento. Quase tive uma síncope com o valor do IPVA. Estou aqui às voltas com uma série de pendências para resolver, boletos para pagar e, de repente, adivinha o que a minha memória puxa lá do fundo do baú? 

Vou dizer logo, porque nem “Mãe Dináh”, se viva fosse, adivinharia, de tão absurdo que é: o álbum do Zequinha.

Se você tem vinte ou trinta anos não deve estar entendo nada e é possível que se pergunte: Quem é Zequinha? 

Explico: Zequinha foi um personagem de uma campanha de arrecadação de impostos do Governo do Paraná no final da década de 70. Bastava juntar determinada quantia em notas fiscais e trocar por pacotes de figurinhas nos postos autorizados. Colecionar as tais figurinhas era a febre da garotada daquela época. Eu era uma delas e o meu álbum estava quase completo. 

Um belo dia, no colégio onde eu estudava, resolveram fazer uma gincana. Uma das provas era levar um álbum do Zequinha. A equipe que apresentasse um álbum completo ou o mais próximo de estar preenchido, ganharia a pontuação máxima. 

No meio daquela tarde barulhenta, em que a pirralhada alvoroçada corria de um lado para o outro cumprindo provas, eu, num canto, agarrada ao álbum, esperava o momento de transferir o objeto mais valioso da minha infância para as mãos da chefe da equipe. 

Chegada a hora, vi quando ele foi apreciado pela comissão julgadora, que deu os devidos pontos para a minha equipe. Havíamos ganhado a prova. Alguns minutos de comemoração com o título, contudo, quando tentei resgatar meu álbum… surpresaaaaa! Ele havia sumido! 

Desesperada, perguntava sobre ele a quem cruzasse o meu caminho.

Diante das negativas, chorei tanto que, na minha inocência, tinha a absoluta certeza que havia esgotado o estoque de lágrimas.

Eu era a desolação em pessoa. Não comi por dois dias e só saí do jejum por ameaça materna. Andava tão triste que nem a mais engraçada criatura da face da Terra seria capaz de fazer brotar um sorriso no meu rosto. 

Essa história aconteceu em 1980 e, até hoje, sou acometida por essa lembrança. Um trauma que já me fez ter comichão, suar frio e arregalar os olhos diante de qualquer pessoa que, por ventura, disser a frase: “Empresta?” 

Tenho pavor de emprestar algo que me pertença, assim como emprestar de terceiros.

Faço o apelo: se alguém souber do paradeiro do meu álbum desaparecido durante a gincana do Colégio Estadual Professora Zilah dos Santos Batista, em 1980, aceito a devolução de bom grado. A criança que ainda habita em mim ficará, imensamente, feliz com o gesto.

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Kátia Muniz

Kátia Muniz é formada em Letras e pós-graduada em Produção de Textos, pela Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras de Paranaguá (hoje, UNESPAR). Foi colaboradora do Jornal Diário do Comércio por sete anos, com uma coluna quinzenal de crônicas do cotidiano. Nos anos de 2014, 2015 e 2016 foi premiada em concursos literários realizados na cidade de Paranaguá. Em outubro de 2018, foi homenageada pelo Rotary Club de Paranaguá Rocio pela contribuição cultural na criação de crônicas.