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Leôncio Correia, a evolução do amor na vida

Paranaense dos mais ilustres, Leôncio Correia nasceu em Paranaguá, em 01 de setembro de 1865. Filho de João Ferreira Correia e…

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Paranaense dos mais ilustres, Leôncio Correia nasceu em Paranaguá, em 01 de setembro de 1865. Filho de João Ferreira Correia e Carolina Pereira Correia, ficou órfão aos seis anos, foi acolhido pelos tios, personagens célebres do campo político local e nacional, o Comendador Ildefonso Pereira Correia, depois Barão do Serro Azul, principal empresário ervateiro do estado do Paraná) e irmão do Senador Correia, alto funcionário do Império e com ampla inserção na Corte.

 

 

Advogado, jornalista, escritor, poeta, professor e politico brasileiro, não abraçou a advocacia nem a magistratura. Começou sua vida pública muito moço, sendo deputado estadual e deputado federal pelo Paraná, no período de 1892 a 1897. Mudando para o Rio de Janeiro, exerceu altos cargos administrativos, no governo do país, tendo sido Diretor da Instrução Pública, Diretor do Colégio Pedro II e Diretor da Imprensa Nacional.

Dedicou-se ao magistério, lecionando História Universal na Escola Normal (hoje Instituto de Educação do Rio de janeiro), da qual foi, mais tarde, Diretor. Foi pioneiro ao criar o Dia da Bandeira, pois, em 1907, quando Diretor da Instrução Pública, tornou obrigatório, nas escolas primárias, a Festa da Bandeira.

Na política, na imprensa e na tribuna, foi sempre um defensor das liberdades públicas, participando das campanhas abolicionista e republicana.

A sua carreira literária foi uma das mais fulgurantes e fecundas. Desenvolveu grande atividade literária, ao lado de Machado de Assis, Olavo Bilac, Paula Ney e outras brilhantes figuras das letras brasileiras.

Era membro da Academia Paranaense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná, da Academia Carioca de Letras, da Federação das Academias de Letras, no Instituto Brasileiro de Cultura, e outras instituições literárias.

Deixou diversos livros publicados, dentre os quais: “Barão do Serro Azul”; “A Boêmia do Meu Tempo” (crônica); “Brasiliada” (poema)”; “Evocações” (crônicas); “Frauta de Outono” (poesia); “Panóplias” (crônicas); “Perfis” (sonetos); “A Verdade Histórica sobre o 15 de Novembro”; “Meu Paraná” (crônicas e versos); “Vultos e Fatos do Império e da República” (ensaio); “Parlendas e Palestras” (discursos), entre outros.

Na vida literária, inegavelmente, o amor é o sentimento que perpassa toda a obra de Leôncio Correia. Amava todos os seres e a sua poesia está impregnada de emoção, ternura e evocações sentimentais. Como denominador comum o amor acompanha a evolução da vida do poeta parnanguara, desde o primeiro ao último verso. É o sentimento gerador e desencadeador das diversas formas e manifestações que nela aparecem. Amava a natureza e a esplêndida natureza de sua terra natal.

Vivendo no Rio de Janeiro, longe de Paranaguá por mais de meio século, continuou a exaltá-la com carinho, nos seus mais belos poemas. Revia, na baia de Guanabara, a beleza nativa da baía de Paranaguá, como as duas portas abertas para o Atlântico, para o mundo e para o seu destino. A vivência na metrópole não conseguiu apagar do seu coração e da sua emoção as reminiscências da bucólica cidade plantada à margem do Itiberê, cujas águas límpidas continuaram a murmurar e refletir a sedução, na sonoridade dos seus versos.

Na maturidade, descreve a sua vida, na infância, em Paranaguá, no poema “Minha Terra”. Evoca a partida da sua terra natal numa das mais belas composições, na forma austera do verso alexandrino, que tanto usou e em que foi um mestre consumado:

 

O CICLO DO DESTINO

Moço, assim abalei. Castelã e castelo
Venci num ato heroico. E, dentro desse anelo,
De sonho em sonho, vim rolando até aqui.

E o castelo a recuar… Sempre a fugir… aos trancos,
Volto, sem elmo, e sou com os meus cabelos brancos,
O mesmo sonhador do dia em que parti!”

 

Na evolução da sua vida, expressa todas as manifestações de amor, permanecendo fiel à sua essência, fortificando-se e purificando-se, indo do amor à natureza, a Paranaguá sua terra natal – ao Paraná, ao Brasil, à mulher, mãe, amada, à pura, à casta, em amor inatingível, platônico, a Jesus, ao Criador, a Deus, a Deus Cósmico.

Manejou, com maestria, as poderosas armas da literatura, seja na tribuna, na imprensa, no parlamento, no magistério e nos altos postos da vida administrativa do país. Sagrou-se como soldado-poeta nos ideais de humanidade e justiça, no conturbado período da História do Brasil do final do Século XIX, tendo participado ativamente dos movimentos abolicionista e republicano.

Leôncio Correia declara, como profissão, o seu amor à natureza e à poesia, em

 

PROFISSÃO DE FÉ

EU, de escolas não sei… Canto, como num ninho,
Ou no galho de uma árvore copada,
Gorjeia o passarinho
Ébrio do vinho de ouro da alvorada.

Ridículo aos meus olhos não me julgo
Se acaso digo que não me envergonho
Do pranto que derramo, ou da dor que divulgo
Entre a poeira dos astros e do sonho.
E que alma, de não ser, pode gabar-se
O escrínio de uma dor profunda e sombria?
Por isso eu dou à lágrima o disfarce
De uma harmonia,

Quando em minha alma escuto o canto lindo, logo
Reponta o luar do Sonho…
Concentro-me, medito, monologo,
Componho…

Como o divino intérprete de tudo
Que faz a pura glória do Universo,
Há uma voz de luz e de veludo:
– O Verso.

……………………………………………………………………

O Verso é uma alma que chilreia e fala
E ante a qual o bom Deus, após fazê-la,
Estático quedou a olhar o seu fulgor;
Como uma ave gorjeia e como o raio estala,
Fulgura como o sol, enleva como a estrela,
Perfuma como a flor.

Espiritualiza, orna, sublima
Como o sonoro carrilhão da rima
O que é vulgar:
Dá voz aos ventos, faz cantar o abismo,
Enchendo de mistério e misticismo
A alma – tão fria – do clarão ao luar!

Ou como um doce riso ou pagando o tributo
À dor ultriz,
Do Verso a Ideia sai como um canário louro,
Como uma abelha da colmeia do ouro
Como da flor o fruto,
E da boca inocente a prece que bendiz.
O Verso é a alma imortal da Natureza:
Dentro do metro da canção
Cabe o mar, cabe o céu, cabe toda a grandeza,
Cabe toda a beleza
Da Criação.”

“Eu” – Meu Paraná – Obras de Leôncio Correia. Edição do Estado do Paraná – 1ª. Edição, 1954.

 

Declara seu amor à sua terra natal, Paranaguá:

“Do meu berço as manhãs trago em minha alma,
E há, no meu coração, seu luar tranquilo,
E sangue do seu sol nas minhas veias.”

 

 

Na infância…

“Ai a tristeza evocativa
De Paranaguá
Onde outrora, uma cativa
Me adormecia cantando
Histórias, em um tom dolente e brando
Do Saci-pererê, do Boi-tatá.”

 

Na maturidade…

“Amei-vos sempre; e, agora, que a saudade
É a única testemunha, comovida,
Dos sonhos mortos da primeira idade,
Mais vos amo.”

 

Seguem-se outros versos intitulados “Ao Itiberê”, “Paranaguá”, “O Pinheiro”, “Curitiba”, entre outros.

Amou com ardor a sua pátria, dedicando a ela um livro inteiro: “Brasilíada”, que contém poemas de caráter cívico como “O Hino Brasileiro!”, “A Bandeira”, “Meu Brasil”.

Na vida adulta, a sua maior produção é o seu amor dirigido a saudar a mulher, mãe, exaltada, a mulher amada, tangível aos sentidos, de reações e atitudes humanas, à mulher casta, pura, inatingível, constantes dos poemas em “Frauta de Outono”.

 

Sobre a Mãe

Na sua época, o poema era tão conhecido com o “Ouvir estrelas”, de Bilac e “Mal Secreto”, de Raimundo Correia. Todos sabiam de cor o seu poema:

 

MÃE

Tu, que a vida me dando, mãe, me deste
Me deste parte da tua, e o teu amor, que enlaça
Meu ser, como uma faixa azul celeste:
Sei que darias, com um sorriso doce,
Para salvar teu filho da desgraça,
A própria vida, se preciso fosse…”

 

Na sequência, encaminha-se para o amor da mulher, com atitudes humanas, e, mais tarde, se dirige para o ideal da mulher transcendente e sublime, etérea e imaginada, como a purificação do amor romântico, em concepção platônica.

 

Primeiramente, a mulher de atitudes terrenas:

“Mais bela anda do que antigamente
Vejo-te agora; as formas mais harmoniosas
E a correção das linhas graciosas
De flor de carne, amorenada e quente.”

 

Depois, o deslumbramento da mulher etérea:

“Passas, e um sulco luminoso deixas
Por onde linda e saltitante, passas,
…………………………………………………….”

 

Sobre a mulher pura:

“De que astro um raio te serviu de escada
Para a terra baixares, linda e pura,
Porém de tal pureza, que depura
As almas vis
de crimes carregadas?!”

             

À mulher inesquecível:

“Dos meus sonhos foi ela a redourada messe,
Das flores que aspirei a de melhor fragrância.”

 

Outras poesias pertencem a esse período: “Amor Sagrado”; “Teu Nome”; “Morte e Amor”; “Não partas”; “A Sua Passagem”; “In Excelsis”, entre outras.

O poeta segue na trajetória do amor ascendente, rumo a esferas mais puras, afastando-se da Terra. A mulher divinizada cede lugar ao amor maduro e espiritual, indo do amor à humanidade, a Cristo, a Deus, e, na última fase, atinge o Amor-Total, realizado no Amor Cósmico.
 

“Jesus! Vós que espalhais da crença a messe,
– Da alma humana solícito pastor –
Na boca, que blasfema, ponde a prece
No coração, que odeia, ponde o amor.”

 

Lapidando seus sentimentos, Leôncio Correia extravasou o amor, purificado em seu estado imaterial e atemporal, declarando-se um enamorado da luz e do sol.
 

“O sol – pulverizador de ouro – pulveriza,
De ouro mais vivo e cintilante, a terra,
………………………………………………………….
A paisagem bebe a luz em largos haustos.”

 

Por ironia do destino, no final de sua vida, completamente cego, escreve um poema que é um hino de luz, alegria interior, realização artística e realização humana. Encontrou na poesia o bálsamo consolador das suas angústias, em embargo das suas inquietações metafísicas, canta o amor ao Criador, a Deus como testemunha e juiz, ao Deus Cósmico.
 

As súplicas ao final da jornada:

NA ANTEVISÃO DO AMANHÃ

“O sofrimento me tornou piedoso
E pôs-me um doce luar no coração…
Bem o sabes, Deus misericordioso!
Para o bem me fez – ao bem me coso,
Para o que o mal me fez – dou meu perdão!”

 

Leôncio Correia, antes de tudo, era um homem forte, um homem bom. Ao confessar que chegara ao termo da trajetória na terra, fala com serenidade sobre sua morte, “sem sobressaltos dolorosos de consciência”.

 

FIM DE JORNADA

“Quase ao termo de longa caminhada
E medindo a extensão da rota obscura
Eis que a saudade amenizar procura
A exaustiva fadiga da jornada.

Cai a sombra da tarde! Da alvorada
Já tão longe! Há vestígios da luz pura
Que no pomar dos risos amadura
Dos frutos bons a safra abençoada.”

 

Os sofrimentos, nos seus últimos anos de velhice, não aquebrantaram a serenidade do seu espírito. Essa tranquilidade transluz surge no seu último soneto que ele mesmo denominou:
 

CANTO DO CISNE

“Cego – completa escuridão… Tateio
Sem um velho cajado a que me arrime,
Expiação, talvez, de um grande crime,
Mas, onde, quando e como pratiquei-o?
Das aves ouço o matinal gorjeio…
Invejo-as, e essa nobre inveja exprime
Uma resolução firme e sublime
De encarar a hora extrema sem receio.
Ao Pai celestial Minh’alma entrego,
Às margens quase da outra vida, cego,
Mas abrasado de infinito amor.

Pelo bom Deus, que me concede ainda,
Quando a minha missão na terra finda,
Esta bendita luz interior.”

Sobre o seu livro de poesias preferido, “Frautas de Outono," confessou: “Este livro é toda a minha vida”. Na realidade, as suas páginas comprovam o sentido humano e a profunda grandeza de sua alma e de seu coração, que o consagraram e o imortalizaram, na literatura brasileira. Othon Costa, no prefácio de “Frautas de Outono”: “Repito a frase de Horácio, nas suas Odes – non omnis moriar.Porque com um livro assim, ninguém, em verdade, morre completamente”. (Rio de Janeiro, 1954).

Leôncio Correia era espírita. Em 1922, entrou para o Congresso Espírita, no Rio de Janeiro. Pertenceu ao Conselho da Associação Espírita Obreiros do Bem, e se tornou presidente da Liga Espírita do Brasil, no triênio 1939-1942. No dia 15 de Novembro de 1939, na Associação Brasileira de Imprensa, na comemoração do Cinquentenário do Brasil República, ocupou a presidência de honra do 1º Congresso Brasileiro de Jornalistas Espíritas.

Leôncio Correia faleceu no Rio de Janeiro, em 19 de junho de 1950, pouco antes de completar 85 anos de idade. Seus restos mortais repousam em sepultura, ao lado da poetisa Júlia da Costa, no Instituto Histórico e Geográfico, em Paranaguá-PR.

Como parte das comemorações do 1º Centenário do Estado do Paraná, o, então, Governador Bento Munhoz da Rocha mandou editar as “Obras Completas” de Leôncio Correia, prefaciadas por nomes ilustres da nossa literatura, como Rodrigo Otávio Filho, Andrade Muricy, Othon Costa, etc. Todos enalteceram, em vários aspectos, a fecunda existência desse inesquecível paranaense. Na ocasião, os livros foram doados a todas as escolas públicas estaduais paranaenses.

Vivendo longe do Paraná e muito além de Paranaguá, sua terra natal, como jornalista, homem público, educador e político, elevou o nome do Paraná a nível nacional, expressando o seu amor cívico à sua pátria, nas palavras:

O meu desejo sempre foi diariamente ouvir o nome do Paraná falado, criticado, caluniado, elogiado, combatido, defendido, motejado, engrandecido, malsinado, mas nunca esquecido!”

 

 

Prof.ª Dr.ª Gilka Correia
Presidente do Centro de Letras de Paranaguá Leôncio Correia.

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS
 

CARNEIRO, DAVID. Galeria de ontem e de hoje. Livro primeiro da galeria de ontem, páginas 381 e 382, Editora Vanguarda, Curitiba, 1963.

CORREIA, LEÔNCIO. Obras completas. FRAUTA DE OUTONO 2. Edição Comemorativa do 1º Centenário do Estado do Paraná, a mando do Governador Beto Munhoz da Rocha, Curitiba-Pr, 1954.

COSTA, OTHON. Frauta de Outono, 2. Obras de Leôncio Correia, Prefácio, Edição do Estado do Paraná, Curitiba, 1954.

KARAN, P R. Leôncio Correia: Biografia. Antologia. Edicção artesanal. Biblioteca Pública do Paraná. 2003.

MURILO, CLAUDIO. Leôncio Correia, o Poeta do Amor. Revista da Academia Carioca de Letras, Brochura com versos e comentários. Editora Prata da Casa, Curitiba, 1957.

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