Por: Kátia Muniz
Querido Papai Noel, preciso lhe contar: uma das maiores tristezas da minha vida foi quando me falaram que você não existia. Arrancaram minha fantasia à fórceps. Fui puxada para a realidade num golpe. Lembro que doeu demais.
Brincava com uma garota um pouco mais velha, quando, do nada, ela me fez a revelação. Não acredito que tenha feito por mal, talvez achou que estivesse me prestando um favor contando a verdade. Nesse dia, descobri que nem toda verdade precisa ser verbalizada. Era certo também que de sensibilidade ela não entendia, pois insensíveis são todos aqueles que nos roubam os sonhos.
Uma vez órfã daquela fantasia, tratei de crescer e buscar outras.
Percebi que amar e fantasiar eram verbos similares, pelo menos na minha cabeça e no meu coração cheio de entrega e intensidade. Percebi também que nem todas as pessoas oferecem amor na mesma medida. Umas têm medo, outras são frias, outras ainda ficam calculando os riscos, algumas fingem que amam e há aquelas que amam por completo e se entregam totalmente. Amar é sempre um convite para visitar paraísos e calvários.
Papai Noel, a vida não é chegada a delírios. Faz questão de entregar a realidade sem nenhuma lapidação. Nasceu! Respira? Pronto. Vire-se.
Entendi bem o recado. Sigo me virando. Tornei-me uma mulher responsável e cumpridora das minhas obrigações, que não são poucas, acredite. Mas também canso e preciso de um respiro.
Encontrei. As letras e as palavras são o meu playground, minha Disneylândia. Descobri que, com caneta e papel nas mãos, posso ser, criar, inventar o que quiser.
O ato de escrever acaba sendo o único momento em que tenho o controle e o descontrole de tudo.
Aqui é uma área que ninguém se mete, ninguém me dá ordens, ninguém me diz o que tenho que fazer ou o que posso falar.
Sou eu e umas pitadas de verdades, eu e as criações e composições, eu e meus questionamentos e eu não sendo eu… Fantasia, capturei você!
Sabe, depois que a Fada do Dente, o Coelhinho da Páscoa e o Papai Noel cumprem com a função que têm na infância das pessoas, acho que a gente endurece para a vida. Mas eu não endureci tanto. Sou autêntica e carrego uma sensibilidade que atravessa a pele.
Foi-se o tempo que eu queria ficar acordada para esperá-lo. Esse ser que eu nunca via, só imaginava. Mas era vencida pelo sono e pelos sonhos. Ainda sonho muito, dormindo e acordada. À noite, sempre com enredos mirabolantes, fica muito mais divertido sonhar. Durante o dia, os sonhos obedecem a uma certa racionalidade, são previsíveis e engessados. A razão nunca conta boas histórias.
Preciso encerrar. Sei que existem outras cartas para ler e uma infinidade de presentes para entregar. Quem diria, Papai Noel, fui arrancada de você há muitos anos e olha só como eu consegui te encontrar: escrevendo. Fico feliz que ainda esteja aqui comigo, dentro da inocência e da fantasia de menina que ainda carrego.
Feliz Natal!