A Grande Reserva Mata Atlântica ganhou, na última terça-feira, 16 de abril, a medalha de ouro na categoria “Melhores iniciativas de trabalho em rede para promover o turismo responsável nos destinos” no 4.º Prêmio de Turismo Responsável WTM Latin America. A premiação ocorreu durante o 11.º WTM Latin America, considerando o principal evento de turismo do continente.
A Grande Reserva concorreu com a sua Rede de Portais, que reúne iniciativas públicas, privadas, comunidades, ONGs e Universidades em ações de articulação e engajamento em prol do desenvolvimento e do fortalecimento do território.
A Grande Reserva Mata Atlântica foi a única iniciativa do Brasil a receber a medalha de ouro dentre as seis categorias do prêmio. No total, foram 158 iniciativas inscritas, um aumento de 200% em relação ao ano anterior, segundo a organização do prêmio. “Isso prova que o turismo responsável está cada vez mais forte em nosso continente”, pontuou o organizador do prêmio, Gustavo Pinto, especialista em turismo responsável e coordenador do prêmio.
Os candidatos foram avaliados por um júri formado por agentes de viagens, operadores, dirigentes de associações, representantes do poder público, jornalistas e formadores de opinião de diferentes países latino-americanos, além de especialistas de organizações reconhecidas pela excelência na promoção do turismo responsável em toda a América Latina. Atualmente, a Rede de Portais da Grande Reserva Mata Atlântica reúne mais de 700 membros de 60 municípios dos estados de São Paulo, Paraná e Santa Catarina.
Marcos Cruz, turismólogo e coordenador da rede de portais da Grande Reserva Mata Atlântica, concedeu uma entrevista para falar sobre o que representa a vitória, sobre o que a iniciativa já conquistou e onde pretende chegar.
A Grande Reserva Mata Atlântica foi vencedora do prêmio Braztoa de Sustentabilidade em dezembro de 2023 e agora, dia 16 de abril, venceu na categoria “Melhores iniciativas de trabalho em rede para promover o turismo responsável nos destinos”. O prêmio Turismo Responsável da WTM Latin America foi lançado em 2019 para reconhecer boas práticas lideradas por empresas latino-americanas. Comente um pouco sobre o que esses reconhecimentos representam para a iniciativa.
Marcos Cruz: Ficamos muito felizes com esses reconhecimentos pelo mercado. Eles nos indicam que estamos no caminho certo para que a Grande Reserva Mata Atlântica se consolide como o destino turístico de natureza que se propõe. Esses reconhecimentos nos dão energia para seguirmos com esse trabalho em rede desafiador, realizado por inúmeras pessoas dos mais variados setores da sociedade, cada uma contribuindo dentro de suas possibilidades e interesses, de modo colaborativo e propositivo, cada uma a seu tempo próprio. Uma proposta disruptiva.
De que forma você compreende que a iniciativa da Grande Reserva Mata Atlântica contribui para a qualificação do turismo no Brasil?
Marcos Cruz: Na Grande Reserva Mata Atlântica, acreditamos que a preservação e a conservação da natureza são fundamentais para o equilíbrio do planeta e para as gerações futuras. Além disso, acreditamos que o turismo pode ser uma atividade econômica positiva quando realizada de forma responsável e sustentável. E não tem como atuar de forma responsável e sustentável se não houver um esforço de melhoria na qualidade dos serviços prestados. Por conta disso, em 2023, lançamos a segunda fase do nosso Programa de Qualificação da Rede de Portais da Grande Reserva Mata Atlântica, que é o primeiro grande passo dado pelos membros da rede na jornada da sustentabilidade.
O Programa de Qualificação é uma oportunidade que os empreendimentos turísticos da rede de portais têm para se destacarem como opções de turismo sustentável para um público crescente que busca por esse diferencial, e tem por objetivos a coerência com a nossa Carta de Princípios, a diferenciação dos serviços turísticos associados à Rede de Portais, apresentando-a como uma alternativa segura e de qualidade, e a sensibilização e estímulo à melhoria contínua dos empreendimentos.
Pode falar um pouco sobre as principais referências internacionais que inspiraram a iniciativa? E de que modo ela pode inspirar outros projetos semelhantes no Brasil e no mundo?
Marcos Cruz: A Grande Reserva Mata Atlântica tem por finalidade mostrar que é possível ganhar dinheiro com a natureza em pé, e sua principal fonte de inspiração é a iniciativa do Parque Esteros Del Iberá, na Argentina. Criada numa região da província de Corrientes que por suas características era considerada um local improdutivo em termos de recursos, pois “não se podia plantar nada e nem criar gado, só tinha mato.” Acontece que, depois de um grande trabalho que envolveu desde a reintrodução de espécies extintas na região até o resgate do orgulho pela cultura local e a sensibilização para o potencial do turismo em áreas naturais, essa região figura hoje como um grande case mundial em ecoturismo.
Além disso, há inúmeras outras iniciativas mundo afora que já mostraram que o turismo em áreas naturais dá dinheiro. O sistema de parques norte americano movimenta mais de 20 bilhões de dólares por ano, um dinheiro que circula nas comunidades de entorno das unidades de conservação. A Costa Rica, com um bioma muito parecido com a Mata Atlântica, tem no ecoturismo uma de suas principais fontes de divisas. Saindo das Américas e indo para a África, são vários exemplos bem-sucedidos de exploração do turismo de natureza. Esses e outros exemplos também são uma importante fonte de referências do que não fazer, já que entendemos que o turismo não é uma solução mágica para todos os problemas, e pode ser prejudicial para as pessoas e para o meio ambiente, caso não seja bem planejado e gerido. Por isso, frisamos que trabalhamos para sermos conhecidos como um destino turístico que preza pela qualidade no que é oferecido.
A iniciativa da Grande Reserva aproveitou esses bons exemplos para adaptar uma solução à nossa realidade, levando em conta a carência de recursos financeiros e a criatividade do povo brasileiro, incorporando aspectos de metodologias de sucesso para transformação de cenários complexos envolvendo uma diversidade muito grande de atores dos mais variados setores. Essa mistura gerou uma abordagem que considera as demandas trazidas pelos membros da rede, de baixo para cima, num ambiente colaborativo onde os trabalhos evoluem no ritmo definido pela sua participação, de modo orgânico, respeitando o tempo de cada um, mas com acompanhamento constante para dar visibilidade e transparência aos temas tratados coletivamente. Isso destrava a amarração tradicional à disponibilidade de recursos para se começar a fazer algo. As ações iniciam com o que se tem à mão e evoluem conforme a energia dedicada a elas, podendo crescer em escala no processo. Isso é facilmente replicável.
Desde que a iniciativa da Grande Reserva teve início, em 2018, já contribuiu muito com a propagação de informações sobre o valor do patrimônio natural no Brasil, certo? Poderia elencar alguns dos principais avanços conquistados pela iniciativa desde quando ela teve início até hoje? Como está o cenário da iniciativa hoje em dia em termos de adesão e valorização dos integrantes?
Marcos Cruz: Creio que um dos principais avanços da iniciativa consiste na contextualização do bioma Mata Atlântica à época da chegada dos portugueses ao Brasil, cobrindo com sua exuberância toda a costa brasileira do Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul, e sua drástica redução ao longo dos últimos quinhentos anos, enfatizando o recorte do maior contínuo restante de floresta e a necessidade de explorá-lo através da abordagem de Produção de Natureza, gerando emprego e renda com a mata em pé. Note que o principal ganho está na mudança de perspectiva, apresentando esse modo produtivo como uma alternativa tão importante quanto outros modos produtivos tradicionais, como a mineração, indústria, agricultura e pecuária, com a diferença de ser, de longe, o mais sustentável no curto, médio e longo prazos.
A adesão à iniciativa tem um crescimento orgânico. Não fazemos busca ativa. Os convites são realizados pelos próprios membros da rede, que são incentivados a identificar quem possa se beneficiar com a abordagem da Grande Reserva. De um início com oito pessoas no final de 2018, já são quase 800 pessoas que assinaram a nossa Carta de Princípios. Além disso, percebemos que as gestões municipais se interessam cada vez mais pela iniciativa, já que mais da metade dos municípios do território aderiram formalmente à Grande Reserva Mata Atlântica.
Explique um pouco o que a proposta da Grande Reserva prevê. E onde espera chegar?
Marcos Cruz: O movimento nasceu da convicção de que a preservação e conservação da natureza são vitais para o equilíbrio do planeta e para as gerações futuras. Defende que o turismo pode ser uma atividade econômica positiva quando realizada de forma responsável e sustentável, podendo viabilizar uma economia restaurativa e melhorar a qualidade de vida de dezenas de comunidades tradicionais e históricas. Este trabalho oferece uma oportunidade única para a conservação de uma das áreas mais importantes em biodiversidade do mundo. A Mata Atlântica é um patrimônio do Brasil e precisa ser valorizada, reconhecida e preservada por todas as pessoas.
A nossa visão compartilhada é ter a Grande Reserva Mata Atlântica reconhecida nacional e internacionalmente como destino turístico pautado na conservação da natureza e valorização cultural e histórica, um destino turístico tão importante quanto o Pantanal e a Amazônia.
De que modo as pessoas participam da iniciativa? Pode explicar mais sobre a Rede de Portais e as vantagens que esses integrantes aproveitam?
Marcos Cruz: A participação é aberta a todos. Instituições públicas, empresas privadas, organizações da sociedade civil e indivíduos que tenham interesse em participar desse processo colaborativo. Aqueles que manifestam esse interesse precisam subscrever a nossa Carta de Princípios, que traz recomendações relativas à proteção do patrimônio natural e cultural, além de solicitar adoção de boas práticas de desenvolvimento sustentável.
A rede adota a abordagem de Impacto Coletivo, uma estratégia para combinar forças de diferentes tipos de atores – ONGs, empresas, governos, comunidades etc. – para endereçar um desafio grande e complexo, que não possa ser totalmente resolvido por uma única organização. A atuação é horizontalmente, sem níveis hierárquicos, propositiva, de participação voluntária e sem custos.
Como principais pontos de atuação onde os membros podem se favorecer estão o estabelecimento de uma agenda comum e de planos de ação conjunta; além da troca de informações entre os membros da rede, propiciando parcerias.
Trazemos uma pegada de governança corporativa, com reuniões mensais de prestação de contas das ações em andamento, as quais têm suas atas publicadas desde o início para trazer transparência ao processo. Além dessas reuniões, há reuniões de trabalho com os vários grupos criados sob demanda dos participantes, num avanço orgânico conforme estes tenham disponibilidade em suas agendas.
E de que modo a iniciativa privada e os governos também aproveitam a participação na Grande Reserva?
Marcos Cruz: Entre os benefícios de quem participa da rede, temos a vinculação da imagem do empreendimento, município ou instituição ao destino turístico internacional; a divulgação nos canais da iniciativa e em nossas campanhas de comunicação; o nosso Programa de Qualificação, que visa guiar o empreendimento turístico numa jornada pela sustentabilidade; o apoio na elaboração de materiais de comunicação de alta qualidade, um diferencial marcante da iniciativa; e o apoio de nossa assessoria de imprensa. Igualmente importantes são as ações de parceiros promovidas em benefício de quem está no território abrangido pela Grande Reserva Mata Atlântica.
Além disso, há oportunidades que podem ser aproveitadas pelos participantes, como o reconhecimento crescente da Grande Reserva na mídia e instituições de turismo (EMBRATUR, Braztoa etc.); as páginas de venda de roteiros oferecidas por parceiros em nosso website, o próprio espaço de rede para conexões e parcerias; o trabalho de posicionamento de mercado resultante de nosso plano de marketing; e a participação em eventos onde a Grande Reserva esteja presente.
Em termos governamentais, a Grande Reserva Mata Atlântica já é um patrimônio público de alto valor, e as instâncias municipais, estaduais e federais podem aproveitar esta iniciativa para a promoção de estratégias de desenvolvimento e conservação da natureza de forma conectada e alinhada, amplificando os benefícios à sociedade. Além disso, o Brasil ganha um novo destino de natureza com grande potencial para concorrer a nível internacional.
Pode comentar um pouco sobre o cenário de Unidades de Conservação no território e de que forma a Grande Reserva contribui para a valorização desses espaços?
Marcos Cruz: Sempre que possível em nossas apresentações, gostamos de fazer um comparativo entre a Grande Reserva e um shopping center. Nos shoppings, são importantíssimas as chamadas “lojas âncora”, verdadeiros chamarizes de público que ajudam a gerar fluxo para as lojas menores. Na Grande Reserva, vemos as Unidades de Conservação como verdadeiras “lojas âncora”, catalisadoras do desenvolvimento do seu entorno. Vejamos dados inspiradores do sistema de parques americanos, que em 2022 recebeu 312 milhões de visitantes, que gastaram cerca de USD$23,9 bilhões durante visitas aos parques nacionais, recursos que apoiaram um total de 378 mil empregos (1). Esperamos um dia chegar lá.
No conceito de Produção de Natureza, as áreas protegidas estão no cerne de todo este processo. Para garantirmos perpetuamente a existência de áreas naturais bem conservadas que nos garantam os serviços ecossistêmicos essenciais para qualquer atividade humana e também o espetáculo das paisagens naturais e espécies nativas, precisamos da existência de áreas protegidas, não só extensas, mas conectadas por meio de mosaicos ou corredores. O território da Grande Reserva Mata Atlântica já corresponde à uma região de grande importância histórica para a conservação da natureza, já que compreende um Patrimônio Natural da Humanidade reconhecido pela UNESCO, está dentro da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica e possui diversos outros reconhecimentos territoriais e culturais em nível nacional e internacional. Só neste território, são contabilizadas mais de 110 Unidades de Conservação, geridas a nível federal, estadual, municipal ou privado.
Compreendemos também que, levando em consideração o conceito de produção de natureza, quanto mais bem geridas e estruturadas forem as Unidades de Conservação, mais se multiplicam os benefícios à sociedade, especialmente no entorno direto destas áreas. Dentro do território, temos uma multiplicidade de categorias de Unidades de Conservação, criadas em diferentes momentos e com diferentes níveis de implantação. A iniciativa da Grande Reserva Mata Atlântica também é um argumento para que se ampliem os esforços e os investimentos que garantam a manutenção do patrimônio natural e para que haja uma pressão positiva por parte da sociedade em apoio a estas áreas e suas instâncias de gestão.
Acreditamos que a preservação e conservação da natureza são fundamentais para o equilíbrio do planeta e para as gerações futuras. Além disso, acreditamos que o turismo pode ser uma atividade econômica positiva quando realizada de forma responsável e sustentável. É nisso que nos pautamos. É isso que buscamos.
Sobre a Grande Reserva Mata Atlântica
A Grande Reserva Mata Atlântica é uma iniciativa voluntária que reúne diversos atores – públicos, privados, não governamentais e da academia – que, juntos, promovem ações de desenvolvimento regional com foco no turismo de natureza dentro do maior remanescente de Mata Atlântica do mundo, com cerca de 3 milhões de hectares de ambientes naturais conservados, localizado entre os estados de São Paulo, Paraná e Santa Catarina. Esta área é considerada um importante patrimônio natural, cultural e histórico, e a iniciativa visa promover este rico território como um destino de turismo de natureza, reconhecido nacional e internacionalmente.
Entrevista e texto por Claudia Guadagnin, assessora de imprensa da Grande Reserva Mata Atlântica