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Entrevista

Paraná sem drogas: promotor aborda uso de álcool na pandemia

“Nas distribuidoras de bebidas, as vendas já cresceram 38% com a pandemia, nas lojas de conveniência o aumento foi de 27%”, revelou o promotor de justiça, Guilherme de Barros Perini (Foto: Divulgação APMP)

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Ele explicou como funciona a atuação do Ministério Público na área

O promotor de justiça, Guilherme de Barros Perini, coordena o Projeto Semear, ação estratégica do Ministério Público do Paraná (MPPR) relacionado ao tema das drogas. A campanha “Junho Paraná sem Drogas” é uma iniciativa instituída no Paraná através de lei estadual em 2017. Na entrevista, o promotor Guilherme explicou como funciona a atuação do MP nesta área e comentou a relação da pandemia com o aumento no consumo de álcool. 

Folha do Litoral News: Como a questão das drogas lícitas, que podem ser comercializadas regularmente, é avaliada dentro do projeto Semear?

Perini: Entendemos, enquanto Ministério Público, que droga é droga. Não é porque é lícita que causa menos danos à saúde. A gente sabe que o cigarro e a cerveja só são lícitos e outras drogas são ilícitas por uma decisão do Congresso Nacional. O Brasil é o terceiro consumidor mundial de cerveja, perdendo apenas para os Estados Unidos e China. O faturamento só da cerveja chega a R$ 70 bilhões ao ano, ou seja, 1,6% do PIB, só no Brasil. Essas drogas só são lícitas por causa de um lobby mesmo da indústria do cigarro e do álcool. Os motivos que levam as pessoas a usarem drogas são os mesmos, esquecer problemas e frustrações, se distrair, escapar de uma timidez ou insegurança para fazer amigos, até mesmo influência social e familiar. Isso está presente tanto nas drogas lícitas como nas ilícitas, por isso tem um tratamento igual no projeto Semear. Existe um uso leve ou pesado das drogas e mesmo o leve pode ser prejudicial, dependendo do organismo de cada um. 

Folha do Litoral News: O projeto Semear fala mais sobre a questão da prevenção?

Perini: Todas as drogas, mesmo os remédios para emagrecer e anabolizantes, são tratadas dentro do projeto. Tem quatro frentes: a ideia é que a gente trabalhe na prevenção, educação e formação, que é a frente principal do projeto, com campanhas educativas nas escolas; uma segunda frente, que é de acolhimento, tratamento e reinserção social para aqueles que já foram dependentes, pois envolve também a área da educação, saúde e assistência social; tem a área de repreensão ao tráfico; e tem uma atuação também na área de capacitação para membros e servidores, uma vez que somos formados em Direito e precisamos dessa multidisciplinariedade e contato com psiquiatras, médicos, psicólogos e assistentes sociais, conhecimentos que passam por outras áreas que não só a jurídica.

Folha do Litoral News: Por conta das medidas de isolamento social, houve algum tipo de aumento em relação ao consumo de drogas?

Perini: Certamente sim. Com a pandemia, as pessoas precisam ficar mais em casa. É uma determinação por conta do isolamento e o menor contato com familiares e amigos, mesmo em eventos, gera mais ansiedade, solidão, falta de perspectiva em relação à vida, medo, todos esses sentimentos que certamente desencadeiam o maior uso de drogas lícitas e ilícitas. As pessoas acham que pode gerar um relaxamento sem prever os efeitos maléficos que essas drogas podem causar. Um estudo da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas diz que nas distribuidoras de bebidas as vendas já cresceram 38% com a pandemia, nas lojas de conveniência o aumento foi de 27%.

Folha do Litoral News: Esse aumento no consumo gerou algum reflexo como, por exemplo, aumento nos casos de violência doméstica e familiar?

Perini: Há uma relação direta do uso de drogas com a criminalidade, assim como a outros fatores. Sabemos que os pais que usam drogas, muitos dos filhos precisam ser afastados do convívio familiar, algo que acontece muito. Sabemos que há relação com problemas relacionados à depressão, suicídio, conflitos familiares das mais diversas ordens. Certamente, a violência doméstica é um deles. Há uma relação do álcool e de outras drogas com a violência doméstica. A Organização Mundial de Saúde fez um estudo em 2018 e diz que o consumo nocivo de álcool está relacionado a 18% dos casos. No meu ponto de vista, essa questão é subnotificada, porque pelo que vimos na atuação na promotoria criminal, quase todos os casos têm relação com o consumo de álcool. É claro que existe relação com o machismo na sociedade brasileira, mas certamente tem relação com o uso excessivo de álcool e outras drogas que geram essa violência. O secretário geral da ONU chegou a pedir que a sociedade proteja mais mulheres e crianças. Temos que lembrar que há casos de estupro de vulneráveis, que também têm aumentado, praticados por parentes ou pessoas próximas. Logo no começo da pandemia houve aumento significativo de denúncias pelo número 180, de 10% em relação ao ano passado e de 50% no Rio de Janeiro em relação às denúncias.

Folha do Litoral News: Quais são hoje os maiores desafios para as autoridades em relação às drogas?

Perini: Os desafios são imensos, já há algum tempo se pensa em como resolver esse problema. O mercado relacionado às drogas é extremamente dinâmico, existem sempre novidades. Muitas drogas antigas têm voltado, a gente percebe que mesmo as drogas produzidas por plantas se tornam cada vez mais sintéticas. A droga que ainda apresenta o maior desafio é o álcool, apesar de lícita, porque é a que produz mais mortes no trânsito, que gera mais violência doméstica e gera maior comorbidades na questão da saúde.

Com informações do MP no Rádio


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