Desde a quarta-feira, 1.º, o Governo do Estado emitiu decreto determinando a quarentena em diversos municípios e regiões do Paraná, entre eles a capital Curitiba e toda a Região Metropolitana (RMC), com fechamento de serviços não essenciais e toque de recolher noturno com foco no combate ao novo Coronavírus, em virtude do aumento de casos e óbitos decorrentes da doença em todo o Estado e, principalmente, nas regiões alcançadas pela determinação. Entretanto, alguns municípios paranaenses que deveriam estar em quarentena decretada pelo Estado, não estão respeitando a medida ou recorreram do decreto. Apesar disso, o entendimento geral é que a regra estadual deve ser respeitada.
Segundo o advogado André Portugal, sócio do Klein Portugal Advogados Associados, Mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Coimbra e professor do FAE Centro Universitário, em regra geral, municípios não possuem autonomia para editar leis que contrariem a legislação estadual em matéria de saúde pública. “Isso porque a Constituição estabelece a competência concorrente apenas entre União e Estados para a legislação em matéria de saúde, cabendo aos municípios suplementarem a legislação federal e estadual. Isto é: via de regra, o município pode apenas legislar em complemento à legislação estadual, adotando, por exemplo, regras mais rígidas, mas não em contradição a ela”, explica.
“É nesse sentido que a jurisprudência tem se formado. Um município, no entanto, poderia pleitear a prerrogativa de aplicar regramento menos severo no caso de demonstrar, com evidências científicas concretas, que o decreto estadual seria desproporcional a sua realidade. Mas, que fique claro: a regra é que o decreto estadual prevaleça, especialmente porque se pressupõe que houve a avaliação individualizada da situação de cada município”, explica.
Penas por descumprimento
Segundo o jurista, quem não respeitar o decreto estadual de quarentena regionalizada vai sentir “no bolso”. “As sanções previstas no decreto são pecuniárias, isto é, multas, que serão maiores, conforme houver reincidência do infrator. O decreto não descarta, no entanto, que outras medidas previstas em outras legislações sejam adotadas. E, a propósito disso, o Estado tem a prerrogativa de, valendo-se do que chamamos de poder de polícia, restringir liberdades de pessoas e empresas – interditando-as, por exemplo. Naturalmente, no entanto, todas essas medidas devem obedecer a critérios de proporcionalidade, que são controláveis pelo Poder Judiciário”, complementa.
Lockdown e bases científicas
O Governo do Estado possui prerrogativa de legislar em matéria de saúde segundo o juízo que fizer da situação, como no caso da pandemia da Covid-19. “Em tese, portanto, é possível a decretação de medidas mais rígidas. A principal limitação a essas medidas está na observância de evidências científicas, como definido pela Lei 13.979/20 e pela própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal”, explica Portugal.
“O respaldo dos decretos restritivos está na Constituição, que atribui a competência concorrente à União e aos Estados para legislar em matéria de saúde. Em caso de conflitos entre esses entes, ainda, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu pela prevalência do interesse mais específico, isto é, o dos Estados, já que seus governadores têm contato mais direto com a situação que será objeto de regulação”, salienta.
Segundo o advogado, o STF definiu que Estados não precisam do respaldo do Governo Federal para adotar as medidas de combate à Covid-19. “O ponto importante, reitero, é que todas essas medidas deverão se basear em evidências científicas. Nestes casos, medidas estaduais que contrariassem essas evidências seriam passíveis de controle judicial”, finaliza.