Por: Kátia Muniz
Desconfio que, durante a linha de montagem, não nos equiparam com amortecedores. Recebemos os golpes e as intempéries da vida de frente. Por um momento, parecemos fortes em relação a isso. Mas não se engane. Desmontamos fácil, fácil. Muitas vezes, em público mesmo, sem nenhum pudor em verter as lágrimas. Outras mulheres, dão-nos a impressão de serem mais enrudecidas. Pura fachada. Só não gostam que a plateia as veja borrar a maquiagem. Represam o choro durante o dia e o liberam à noite, quando estão sozinhas, encharcando e amarrotando o travesseiro.
Falar é o verbo que mais sabemos conjugar. Deslizamos com desenvoltura em todos os tempos e modos verbais. Definitivamente, não nascemos para o laconismo. Não economizamos no vocabulário. Gastamos, sem dó nem piedade, as conjunções: e, mas, ou, logo, como, porque, pois, que, então. Somos doutoradas em fazer ligações nas frases. Temos sequências delas prontas, na ponta da língua, esperando a oportunidade do voo livre. Assim, é só puxar conversa e se preparar para a avalanche de expressões.
Quer um resumo de nós? Esqueça. Somos excessos. Uma única versão é capaz de carregar dentro de si outras tantas. Todas habitando o mesmo condomínio interno, que ora explode, ora se torna mais amável. Mulher é, e sempre será, uma caixinha de surpresas.
Em geral, por volta dos 12 ou 13 anos, nosso corpo dá sinais de aerodinâmica, ganhamos curvas e uma nova moldagem. Viramos escravas dos sutiãs e dos absorventes, enquanto as inseguranças nos acompanham em cada olhada no espelho. Algumas, insatisfeitas, turbinam itens de séries.
Aceleramos. Ganhamos velocidade. As mais intensas, geralmente, esquecem de fazer as revisões nos freios. Não sabem direito a hora de parar. Seguem em alta voltagem, usando a capacidade máxima do motor. Acidentes acontecem, é claro. Batem de frente com um amor, acumulam frustrações e desilusões, recebem multas por imprudências, mas não param. No máximo, um pit stop no salão de beleza, que é onde costumamos azeitar as engrenagens para seguir em frente.
Afivelamos o cinto e seguimos, porque a estrada costuma ser longa. Para aliviar o percurso, que haja muitos porta-trecos. Adoramos um espaço para exercitar nossa capacidade infinita de preenchê-los. Um batom aqui, as chaves da casa ali, o controle do portão acolá e um espelhinho a mais, confirmando que só o retrovisor não nos satisfaz.
Enquanto estamos em movimento, não há motivo para preocupações. O sinal de alerta deve soar quando silenciamos, quando o motor dá indícios de desgaste.
Nosso silêncio costuma ser a maior evidência de que estamos precisando de um recall.