O Projeto 5C (Centro Cultural Cecília Correa Carvalho), atuante em Paranaguá há cerca de oito anos, já atendeu mais de 4 mil crianças no município, com foco principal de atuação no Parque São João, assim como nas escolas municipais e em ações diversas de forma descentralizada e ampla, com alfabetização, leitura, orientação, esporte e constante apoio. Segundo o idealizador do 5C, João Costa Júnior, além de focar a transformação através da educação, a iniciativa visa conscientizar sobre os malefícios do uso das drogas, bem como valorizar a identidade parnanguara, reforçando a importância cultural e histórica da cidade-mãe do Paraná junto a milhares de crianças e adolescentes.
“Sou nascido em Paranaguá. Sou criado no mesmo bairro em que eu nasci. A minha vida toda passei nesse bairro em Paranaguá. No aniversário da cidade é muito gratificante eu poder estar falando essa história de evolução na cidade, porque, há 30 anos atrás na minha infância, o bairro em que eu nasci, que é o Parque São João, era considerado a quebrada de Paranaguá, era considerado um bairro onde havia favela mesmo, vamos dizer. Hoje em dia essa comunidade foi se afastando e o Parque São João não é mais mal visto na cidade. Porém, vejo que a criançada dos outros bairros próximos ao Parque São João ainda tem esse estigma. Muitas crianças e jovens nem falam o nome do bairro onde moram, falam que é no Parque São João, que é o bairro mais próximo. Falta um pouco da gente valorizar o que é nosso. Quando falamos do aniversário de Paranaguá gosto de abordar esta valorização do Parque São João, de um São Vicente, do Labra, da Vila do Povo. Que a gente comece a valorizar mais os nossos bairros, as nossas quebradas, fortalecendo esses vínculos”, afirma o idealizador.
Segundo João, um dos projetos, o “Pá na Água”, busca, por meio da remada, levar crianças do Parque São João para o Centro Histórico de Paranaguá, com foco na valorização histórica e cultural do município. “Atendemos as crianças da comunidade trazendo elas para o centro da cidade parar remar, mostrando o quanto Paranaguá é uma cidade bonita, com ilhas maravilhosas, comunidades pesqueiras e caiçaras incríveis, a nossa orla do Rio Itiberê vista do rio é maravilhosa. Mostramos a esses jovens que daqui a pouco são eles que estarão cuidando da cidade, em cargos nas empresas e postos políticos, e se eles não tiverem contato desde cedo com a nossa cultura, valorizando o que é parnanguara, dificilmente lá na frente eles vão cuidar”, ressalta.
Conscientização e projetos
“O 5C surge primeiro para conscientizar esses jovens, mostrando a eles que as drogas fazem mal sim, a ponto de levar meu primo embora. Mas a partir da dor de ter perdido meu primo, a gente pode construir algo com amor, esse amor que movimenta todos os nossos projetos há quase oito anos, levando conhecimento, cooperação, valorização da cultura e da nossa comunidade, focando a conscientização de que devemos cuidar do que é nosso, do nosso planeta também, e principalmente a consciência de não se envolver com as drogas, porque eu falo para eles que não experimentem, porque a gente não conhece nosso organismo, e se ele pedir mais não tem volta, meu primo não teve volta, quero dizer às crianças e adolescentes que não se envolvam, que não comecem, porque a gente não sabe o dia de amanhã”, explica Costa Júnior.
O fundador do projeto ressalta que um dos focos é o “5C na Escola” que em 2022 entregou 2 mil livros infantis e neste ano entregará mais 2 mil edições para jovens do quinto ano da rede municipal de Paranaguá. “Vamos com a Kombi Home, com a Dançarina, visitar e conversar com as crianças e no final eu entrego um livro para que busquem mais conhecimento, para que eles valorizem a nossa cultura e que eles cooperem uns com os outros e cooperem em casa. Cooperem com os professores, com a escola, que tenham harmonia com a comunidade e que se conscientizem de que a droga faz mal, reforçando que é possível sim construir um mundo melhor e com mais harmonia”, afirma João.
“Outro projeto importante é o Pá na Água, onde inclusive quero mandar um abraço ao Alex, da Passaúna Paddle Club, que cede a canoa para a gente poder fazer a remada. Esta iniciativa traz crianças e adolescentes do Parque São João, do Labra e outros bairros para o centro da cidade, para eles remarem no rio Itiberê, praticando o esporte, valorizando a nossa natureza, nossas ilhas, nossa cultura, sendo que antes de cada remada a gente realiza alguma instrução, trazendo histórias e contos de Paranaguá, sobre a Ilha da Cotinga, por exemplo. Então, além de trazer o contato com a natureza, o ‘Pá na Água’ transmite sincronia e harmonia através de cada participante que rema em conjunto, trabalhando em equipe”, ressalta o idealizador.
Outra iniciativa do 5C é o “Cine 5C'”, que produziu um filme próprio em 2019, produção que chegou a ser exibido nos Estados Unidos, em Harvard, que chegaram a visitar o projeto. “Eu falo para a criançada que se um sonho de ir ao cinema gerou esse filme nosso que alcançou outro canto do mundo, nos Estados Unidos, que o pessoal veio de lá para conhecer a nossa quebrada, a nossa casa no Parque São João e assistir o filme conosco, é possível fazer qualquer coisa. Isso reforça que as crianças não desistam dos seus sonhos. Soltando um spoiler, vale ressaltar que estamos escrevendo o filme Improváveis 2, mas antes estamos reconstruindo o nosso barracão para termos um cinema adequado, uma sala de gravação e estrutura para podermos produzir com ainda mais qualidade”, acrescenta.
“Temos também o projeto da Web Rádio 5C, assim como estamos iniciando algumas oficinas, entre elas uma de podcast, algo que já estamos planejando e realizando desde antes da pandemia. A intenção do podcast é que a criançada traga a informação do meio dele aos outros, mostrando a sua quebrada e o que eles tem para falar para a sociedade. Outra iniciativa é o Cumbuca 5C, uma metodologia do Falconi, que é um autor brasileiro importante, sendo que o projeto nada mais é do que um clube do livro, de leitura de livros, só que ao invés de todos discutirem, a gente sorteia dentro da cumbuca o nome de um dos participantes, que terá que apresentar aos outros o que ele entendeu do capítulo, algo que estimula a leitura, a oratória, a discussão, o debate, a interpretação, estudando inclusive o livro do 5C, onde contamos a nossa história nesses oito anos procurando desenvolver propósitos de vida e profissionais junto a adolescentes, uma fase complicada para todos. Eu inclusive passei por um período de ansiedade e depressão, algo que conto no livro, focando aos outros como sair desta situação, ajudando quem está com depressão e que eles possam falar sobre o assunto”, afirma Costa Júnior.
Projeto de vida e voluntariado
Segundo ele, junto a crianças e jovens, é ensinado não somente a importância de ter riqueza, mas de ser um cidadão e uma pessoa que contribua com a sociedade e com a evolução humana, trabalhando conceitos do primeiro emprego para adolescentes e inclusão no mercado de trabalho. “Ensinamos a como fazer um currículo, a importância de estudar e se capacitar com cursos, no final demonstrando a eles como montar um projeto de vida, discutindo o que foi aprendido e o que eles irão fazer no presente e futuro, qual área pretendem trabalhar, se pretendem abrir seu próprio negócio, atuar por meio da música, da arte e cultura, reforçando também a importância de ser voluntário”, explica.
Segundo João, todos os sábados o 5C atende uma média de 70 a 80 crianças no Parque São João. Além disso, 12 adolescentes fazem parte do Cumbuca 5C, número reduzido para que a discussão possa ocorrer e por conta da quantidade de livros. “Eu tenho um grande sonho de ampliar cada vez mais o 5C. Em festas comunitárias como Páscoa, Dia das Crianças, Festa Junina, Natal, chegamos a atender somente no nosso bairro e localidades próximas mais de 300 crianças de até 12 anos. Então, se eu atendo 60 em um sábado, por exemplo, há mais 240 crianças que estão no bairro e eu não estou atendendo ainda. Então, para o ano que vem, no mínimo queremos atender essas 300 crianças todos os sábados”, explica.
“Com relação ao 5C na Escola, atendemos duas mil crianças dos quintos anos da rede municipal, mas o nosso desejo é atender os cinco anos iniciais, ou seja, o primeiro, segundo, terceiro, quarto e quinto ano, alcançando quase 10 mil crianças por ano, algo que não é só um sonho, mas um grande desafio. Então, seriam 10 mil crianças por ano onde, sendo que atualmente temos um livro específico para o quinto ano, mas a ideia, junto à editora, é a produção de livros específicos para cada ano, acompanhando a criança desde o início da alfabetização até a adolescência, discutindo propósitos de vida, fazendo com que o 5C permeie Paranaguá de um jeito abundante”, salienta João.
Sede
Outro passo importante que está sendo dado é a revitalização da sede própria do 5C no Parque São João, explicando que, além do alcance do projeto, a intenção é focar a parte estrutural e documental do prédio, com foco na segurança do espaço e das crianças. “Estamos melhorando a nossa sede, melhorando os banheiros, focando instalar piso antiderrapante, cumprindo as exigências da Vigilância Sanitária. Vivemos de doação. Conseguimos as ferragens para as colunas e vigas, estamos captando tábuas de madeira para fazer as caixarias e receber o concreto, sendo que já ganhamos os blocos para levantar as paredes, algo que está parado aguardando a gente construir as pilastras para assentar os blocos. Querendo ou não tudo é dinheiro. Possuímos amigos que ajudarem com doações, mas precisamos de uma pessoa especializada para nos ajudar a desmontar o barracão, algo que também está sendo feito por mim e pelos voluntários”, explica, explicando que “também aguardamos uma possível parceria com uma construtora, com algum profissional, porque mão-de-obra temos”, acrescenta.
“Estamos nesse processo de captação. Desejamos muito finalizar essa revitalização até o Dia das Crianças, em outubro”, salienta, destacando que recentemente foi realizada uma festa junina do 5C que ocorreu na rua em frente à sede. “O desejo é que no Dia das Crianças esse espaço já esteja construído para eles já vejam um lugar novo e saber que é ali que eles vão construir os sonhos deles. Nesses oito anos eu já realizei muitos sonhos meus, mas eu me senti muito mais realizado nos sonhos da criançada, vendo as crianças que começaram no 5C e hoje são jovens aprendizes, por exemplo, que está trabalhando, que ajudou na produção do filme e que em um mês e meio aprendeu a falar inglês para conversar com o pessoal dos Estados Unidos. É a sensação de que os sonhos que serão construídos na sede vão muito além do que a obra física”, afirma João.
Solidariedade
A solidariedade, o amor ao próximo e o voluntariado são itens presentes no 5C, que fizeram com que a instituição se tornasse realidade e alcançasse cada vez mais crianças no decorrer dos anos. “Nesses oito anos que sou voluntário houve uma mudança de chave grande na minha cabeça. Nos cursos de capacitação que eu fazia, as pessoas falavam o que seria do projeto se eu conseguisse dedicar 100% do meu tempo a ele, então, a partir deste ano, eu estou ainda mais voluntário, me dedicando 100% ao 5C. O voluntariado é a minha vida hoje”, explica, destacando que cerca de 5 mil crianças foram atendidas nos oito anos do projeto, tudo isso por meio do apoio de voluntários, alguns deles que inclusive eram participantes do próprio projeto.
“Acredito que a gente está construindo uma sociedade mais colaborativa, com uma cultura de colaboração, levando em conta que sozinho a coisa até vai, mas não chega longe, sendo necessário de união e esforço coletivo para ir mais longe. O voluntariado é essencial para a nossa instituição e para tantas outras. Além de pedir recursos financeiros, o nosso maior pedido é para que as pessoas sejam voluntárias no 5C, para que elas conheçam o projeto e avaliem se vale apena ajudar financeiramente”, ressalta João, explicando que na instituição há voluntários de várias áreas diferentes. “Quem é voluntário ganha muito mais do que está sendo beneficiado. A gente aprende muito mais. É nesse tipo de sociedade que eu acredito, uma sociedade mais colaborativa, cooperativa, com presença de voluntariado”, completa.
“Acredito que o maior tipo de doação que podemos fazer é doar o nosso tempo. O tempo é o que a gente tem de mais valioso. Então, quando a gente doa este tempo para fazer o bem, para ajudar o outro, nós estamos ganhando tempo, e não o contrário”, finaliza João Costa Júnior.