O Paraná é o Estado brasileiro com a maior área contínua de Mata Atlântica do Brasil, concentrado no Litoral e na Serra do Mar, com cerca de 6 milhões de hectares, com florestas em diferentes estágios de regeneração. Toda essa riqueza natural implica em proteção legal reforçada. Para preservar um dos mais importantes biomas brasileiros, a região é regulada por um conjunto robusto de normas estaduais e federais.
A advogada e mestre em Meio Ambiente e Desenvolvimento pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), Luciana Ricci Salomoni, explicou que se destaca o Plano de Desenvolvimento Territorial Sustentável do Litoral do Paraná (Decreto nº 2.647/2011) e o Decreto nº 8.910/2018, que estrutura a governança ambiental da região.
“Existem também restrições de uso vinculadas a unidades de conservação federais, estaduais e municipais, como o Parque Estadual Ilha do Cardoso, Estação Ecológica de Guaraqueçaba e diversas RPPNs (Reservas Particulares do Patrimônio Natural)”, disse a advogada, que também é membro da rede Latin American Climate Lawyers Initiative for Mobilizing Action (LACLIMA).
Além disso, o litoral paranaense integra a Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, reconhecida pela UNESCO, que impõe diretrizes internacionais para equilíbrio entre conservação, uso sustentável e bem-estar das comunidades locais.
“Portanto, qualquer atividade econômica, turística ou de infraestrutura na região deve se adequar não apenas às exigências gerais da legislação ambiental brasileira, mas também às regras específicas que protegem a rica sociobiodiversidade do litoral, considerada de interesse global”, afirmou Luciana.
Lei da Mata Atlântica
O art. 225, da Constituição Federal de 1988, qualifica a Mata Atlântica como patrimônio nacional. Diante da sua importância, o bioma tem uma lei especial: a chamada “lei da Mata Atlântica”.

A lei protege estabelece regras específicas para proteção, uso e recuperação desse bioma, o que implica na atuação de empresas. “Qualquer empresa que opere em áreas abrangidas pela Mata Atlântica precisa observar critérios rigorosos, especialmente para atividades que envolvam supressão de vegetação, implantação de empreendimentos, expansão urbana ou obras de infraestrutura”, comentou Luciana.
O primeiro impacto recai sobre o licenciamento ambiental. Qualquer intervenção em áreas com vegetação nativa, seja floresta, manguezal ou restinga, exige autorização dos órgãos ambientais, com base em estudos técnicos e análises criteriosas.
“A lei também prevê obrigações como compensação ambiental, recuperação de áreas degradadas e observância dos diferentes estágios de regeneração da floresta. Além das restrições, a Lei da Mata Atlântica oferece instrumentos econômicos que favorecem negócios alinhados à conservação”, ressaltou a advogada.
Para ela, a relação das empresas com a lei vai além do cumprimento de obrigações. Preservar a Mata Atlântica é também uma estratégia para acessar mercados, financiar projetos, gerar renda e se alinhar às práticas de responsabilidade ambiental.
“Exemplo disso é o reconhecimento internacional, em 2025, da viagem de trem entre Curitiba e Morretes, operada pela Serra Verde Express, como uma das melhores experiências ferroviárias do mundo. A rota atravessa trechos bem preservados da Mata Atlântica na Serra do Mar, o que evidencia que a conservação se traduz em geração de valor para a economia local”, frisou Luciana.
Emergência climática
A Mata Atlântica, terceiro maior bioma do Brasil, é essencial para a estabilidade climática do País e relevante para o planeta. Embora reste apenas 12,4% de sua cobertura original – sendo que 80% desses remanescentes estão em áreas privadas, ela ainda abriga uma das maiores biodiversidades do mundo.
“Com mais de 20 mil espécies de plantas e cerca de 2 mil espécies de animais, é notória por sua alta riqueza em endemismos, ou seja, espécies que são únicas à localidade: 40% desses seres vivos não existem em nenhum outro lugar do planeta – muitos deles ameaçados de extinção. A Mata Atlântica enfrenta sérias ameaças, como o desmatamento e a fragmentação de habitats, que comprometem a conservação da sua biodiversidade”, frisou Luciana.
No Paraná, o Parque Nacional do Iguaçu, com seus 185 mil hectares, é o maior remanescente de Mata Atlântica de interior no Brasil. Ali, vivem espécies ameaçadas, como a onça-pintada, evidenciando a importância da conservação para garantir resiliência ecológica e climática.
“A lei da Mata Atlântica, ao estabelecer barreiras ao desmatamento, exigir a recuperação de áreas degradadas e proteger florestas primárias, é uma ferramenta decisiva para que o Brasil cumpra compromissos internacionais assumidos na Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), na Convenção do Clima (UNFCCC) e nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU”, declarou a advogada.

COP30
A COP30 será realizada em Belém do Pará em 2025, com foco no bioma Amazônia, mas isso não diminui o protagonismo da Mata Atlântica. “Pelo contrário: a preservação desse bioma será apresentada como uma das principais contribuições do país para conter tanto a crise climática quanto a perda de biodiversidade”, destacou a advogada.
Luciana ressaltou que há uma conexão direta entre a Lei da Mata Atlântica e os novos instrumentos de financiamento climático que ganharão espaço na COP30, como os créditos de biodiversidade. Esses créditos funcionam como certificados que remuneram quem protege a natureza.
“É uma estratégia que começa a ganhar espaço também no Brasil, com exemplos como a Política Estadual de Crédito de Biodiversidade do Paraná, um programa pioneiro que busca criar incentivos econômicos para quem mantém ou recupera áreas naturais, contribuindo para a conservação de espécies, a recuperação de habitats e a melhoria da qualidade ambiental. Ao mesmo tempo, permite que empresas compensem os impactos de suas atividades”, finalizou Luciana.