Ciência e Saúde

Demência pugilística: médica neurologista explica sobre a doença que vitimou Maguila

Ex-boxeador doou seu cérebro para a ciência

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Foto: Divulgação

O ex-boxeador José Adilson Rodrigues dos Santos, o Maguila, morreu no dia 24 de outubro, em São Paulo, vítima de uma doença irreversível, a demência pugilística. Ele tratava a doença, mas teve uma piora no quadro. Após o velório, seu cérebro foi doado para estudos para o único banco nacional elaborado para estudar doenças neurológicas no País, pertencente à Universidade de São Paulo (USP)

Depois do falecimento de Maguila repercutir no Brasil e no mundo, surgiram dúvidas sobre a demência pugilística, quem está suscetível à doença e se há meios de prevenir.

Quem explica essas e outras questões é a médica neurologista e professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Dra. Viviane Flumignan Zétola. Segundo ela, há vários tipos de demência, como a relacionada à degeneração, como a demência de Alzheimer, a frontotemporal, a demência de corpos de Lewy e a demência corticobasal.

“Existem os traumas por repetição. Essa do lutador, em questão, muito provavelmente é por uma encefalopatia traumática, por traumas de repetição levados durante o esporte. A gente chama isso de encefalopatia traumática crônica”, disse a médica.

Além do boxe, a demência pugilística também está relacionada a atletas de futebol americano, outro esporte de muito impacto. A médica cita o filme “Um Homem Entre Gigantes”, estrelado por Will Smith, que conta a história real do médico que através da ciência coloca em pauta o embate entre a ganância empresarial e o conhecimento científico quanto a demência pugilística.

“Já que esse tipo de demência tem como base o trauma, a forma de evitar, na verdade, é não ter o trauma. Vêm algumas perguntas na literatura que dizem que diversas pessoas têm o trauma, e aí uma determinada pessoa desenvolve e outras não. Pode haver, então, uma predisposição de alguns pacientes. O trauma de repetição levaria a isso na maioria dos cérebros, na dependência da intensidade e da frequência desse tipo de trauma, da falta de proteção que é colocado no esporte”, considera a médica.

A frequência das lutas também é algo que deve ser levado em conta. “Existe uma luta e há um trauma que não tem fratura da cabeça, tem só o chacoalho do cérebro dentro da caixa craniana. Ao redor do crânio, do osso, a gente tem o líquor, que seria um amortecedor, é uma camada de água, mas o cérebro, na dependência do impacto, mesmo com a camada de água tentando amortecer, ele bate na frente, ele chicoteia para trás, ele bate novamente na frente. Após um trauma como esse, o ideal seria ter uma demora entre se submeter novamente a esse risco, ter um espaçamento”, observou a Dra. Viviane.

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“O trauma de repetição levaria a isso na maioria dos cérebros, na dependência da intensidade e da frequência desse tipo de trauma”, disse a médica neurologista, Dra. Viviane Flumignan Zétola. (Foto: Divulgação)

Como é feito o diagnóstico

A encefalopatia traumática crônica, a chamada demência pugilística, pode ser diagnosticada de forma clínica pelos neurologistas, avaliando se há distúrbio no comportamento.

“O diagnóstico não parte de um exame específico. O exame é só para afastar uma lesão maior que possa ter acontecido, mas a encefalopatia é mais a frequência e a intensidade das lesões repetitivas do que necessariamente pode ser mostrado. Eu vou diagnosticar isso quando um paciente vier com um distúrbio de comportamento, na maioria das vezes apresentando psicoses, distúrbios de humor, basicamente distúrbios mais psiquiátricos, e se tiver essa história de traumas repetitivos”, disse a médica.

Assim como mudanças de comportamento ou até alterações que mostrem que uma função alterada do cérebro, até a função de linguagem, fala desconexa. “É um diagnóstico clínico que vem de uma anamnese que conta a história do paciente, quem é o paciente, qual é a profissão desse paciente. Alguns podem desenvolver até uma espécie de um parkinsonismo. São pacientes que vão ter tremores, lentificação, não só do pensamento como uma lentificação física. O diagnóstico é feito baseado nisso”, afirmou Dra. Viviane.

Doação do cérebro para a ciência

Maguila não foi o único a declarar a vontade de doar seu cérebro para a ciência. O jogador Bellini, capitão da seleção brasileira em 1958, e o boxeador, Éder Jofre, também tiveram o mesmo gesto. Há seis anos, Maguila fez uma “declaração de vontade”, forma em que manifesta seu interesse em doar o órgão.

Para a médica, quando se permite esse estudo do corpo após a morte, independente de ter demência ou não, há um aprofundamento do conhecimento da ciência. 

“A ciência vai se moldando. Nos tempos passados, se moldava muito pelo conhecimento de necrópsia dos pacientes. A ciência está em busca de casos. Nos Estados Unidos existe muito isso. Esse caso do Maguila, especificamente, vai poder, com o estudo de necrópsia, fortalecer ou até afirmar esse diagnóstico”, concluiu a médica.

Demência pugilística: médica neurologista explica sobre a doença que vitimou Maguila

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Gabriela Perecin

Jornalista graduada pela Fema (Fundação Educacional do Município de Assis/SP), desde 2010. Possui especialização em Comunicação Organizacional pela PUC-PR. Atuou com Assessoria de Comunicação no terceiro setor e em jornal impresso e on-line. Interessada em desenvolver reportagens nas áreas de educação, saúde, meio ambiente, inclusão, turismo e outros. Tem como foco o jornalismo humanizado.