Professor Henrique José de Souza
A FILOSOFIA PREGADA POR KUNATON
Os hinos religiosos compostos por Amenophis IV testemunham uma inteligência mística, uma sensibilidade muito viva, que se espalhava por toda a sua natureza. Era ele de um coração bondoso a toda prova, embora que violento contra tudo quanto achava prejudicial à felicidade humana. Espírito sutil, tenaz e sistemático, este so- nhador e místico ia até o fim de suas ideias, além de rápido nas suas resoluções.
Infelizmente, seu reinado durou apenas dezesseis anos1, o que lhe não permitiu implantar as suas elevadas ideias na Terra, que outras não foram, senão, as de resta- belecer à sua prístina integridade, a Sabedoria Iniciática das Idades, por outro nome, Teosofia (hoje Eubiose).
Aton é o disco solar; é a forma tangível e visível de Rá, o Sol, o mais antigo e popular, talvez, dos deuses egípcios, sem falar em Osíris ao lado de Ísis, como a dupla manifestação da própria Divindade, que já era venerada nos tempos atlantes, embora que debaixo de outros nomes.
É representado sob a forma de um disco dentro do qual se acha um ureus2. Os raios do disco (em número de 13…) caem até o solo, como braços munidos de mãos, e estas depositam oferendas sobre os altares; estendem o signo da vida nas narinas do rei (“o hálito de Brahmâ nas narinas de Adam”… como dizem as escrituras orien- tais), cingindo-o e aos seus – como uma Família privilegiada, deifica etc. (Sacra Família) por meio de amplexo. Em resumo, Aton se torna, para Kunaton, o que era Amon para os Amenophis: um deus verdadeiro, um pai, e não um tirano, um verdugo capaz de destruir a sua própria criação.
O rei procurou colocar a serviço de Aton um sacerdócio sob o tipo do clero te- bano. Aton é originário de Heliópolis (hoje Balbeck ou Baalbeck, se o quiserem) e seu Sumo Sacerdote traz o mesmo título de Ur-Ma ou “o grande Vidente”, tal como o de RÂ. Mas o rei não quis confiar a velha cidade de Heliópolis à guarda do novo culto. Foi em uma nova cidade “Kutaton” ou “Horizonte de Aton”, hoje El-Amarna, sobre a mar- gem direita do Nilo… entre Tebas e Menfis, que ele fundou o templo de obelisco
central, consagrado ao deus Aton (tal como na Atlântida, o dedicado a Posseidonis…). Na Núbia, próximo à terceira cascata, edificou uma outra cidade Gem-Aton, “a Joia de Aton”, e na Síria, uma outra cujo nome embora desconhecido, podemos afirmar que foi Muk-Aton, ou “a Morada de Aton”. Ambas servem de capitais em países conquis- tados ao novo deus do Estado.
Não somente o faraó toma por conta a gestão dos bens do novo deus, como organiza e formula a sua doutrina (tal como fazem os “Manus”…). A revolução por ele realizada não foi apenas política e econômica. Depois de se ter assenhoreada do sa- cerdócio e dos bens de “mão morta”, procurou modelar as almas e orientar a fé para um outro ideal mais humano, o que bastava para provar a sua estirpe superior ou divina.
Como dissemos anteriormente, seus hinos de rara beleza e de inspiração e ex- pressão verdadeiramente transcendentes não encontram iguais. É um verdadeiro adorador da Natureza! Os egiptólogos admitem seus hinos “como exprimindo concei- tos novos na literatura teológica dos egípcios: a adoração de um deus qualificado, Único, Só, criador todo poderoso; a expressão de um sentimento da natureza, que associa o homem, os animais, as plantas, a água e a terra, na adoração do deus. Pro- vidência Única de tudo quanto existe e vive. Tais sentimentos e expressão se torna- ram coisas inéditas no Egito.
A intenção do rei parece ter sido: propor à adoração dos egípcios, não mais um deus artificial, particular à determinada cidade, nem de caráter exclusivamente naci- onal, e sim, um deus encarnado, uma força da Humanidade, cujo poder e benefícios para todos, não aparecem em nenhuma parte mais absolutos do que nos países do Oriente. Tal deus não se apresenta mais aos homens como outrora, sob a forma de um falcão heráldico; é um disco radiante, que se torna a expressão viva da Divindade; um jeroglifo, que todos os homens, egípcios ou não, saberiam ler e compreender logo à primeira vista.
Nas escrituras orientais, as três emanações divinas (a Trimurti indiana, que é o mesmo Pai, Filho e Espírito Santo do cristianismo) são expressas do seguinte modo:
Nesse caso, a primeira como Brahmâ se assemelha ao próprio disco solar ado- tado por Kunaton.
Nos ideais do grande Faraó estavam sintetizados os mesmos princípios adotados pela Teosofia (Hoje Eubiose), que outra não é senão, conforme já dissemos, a Sabe- doria Iniciática das Idades, de que Ele mesmo se fizera portador para o mundo.
Corroborando uma doutrina muito mais antiga existente no Egito, digamos, pro- cedente de Atlântida (cujos Templos eram quase todos dedicados a IO ou Ísis), achava ele que “no centro do mundo existe uma energia vivificadora e ponderadora que, di- ante dos seres vivos, joga o papel de Providência. Essa Energia é, ao mesmo tempo, Calor, Vida e Pensamento (Vontade, Atividade e Sabedoria, dizemos nós). Conhece- se um texto daquela época, onde o deus PTAH, tal como Aton é chamado a Inteligên- cia e a Língua dos deuses, Fonte de pensamentos de todo deus, de todo homem e de todo animal”.
Platão e até mesmo Santo Agostinho não fizeram mais do que expressar as mes- mas ideias de Kunaton, quando dizem: “É o próprio Verbo, o Verbo alado, que, pelo comércio, as artes, a ciência, circula através dos homens, aproximando-os uns dos outros (a exigência da Fraternidade Universal da Humanidade) e servindo de Mensa- geiro ao Pensamento Divino”.
A reforma do rei Amenophis IV não foi, propriamente, uma reação política contra a autoridade invasora desses “intendentes do palácio”, que eram os grandes sacer- dotes de Amon, mas tão somente uma forma mais humana de religião, ou seja, a mesma concepção arcaica que tinha tido a sua florescência no tempo do antigo Im- pério, quando o deus Râ, dominava os deuses vivos; ou melhor, uma reminiscência atlante mais consentânea com os princípios superiores ou divinos…
No fim do seu reinado, o Faraó delega ao seu mais devotado confidente – Morirá confiando a outro de nome Mirtaba (nome e fato desconhecido dos próprios egiptó- logos), a administração financeira e jurídica do Egito. Nesse caso, uma espécie de Co- lunas ou Ministros, de que Ele, Kunaton, representava a (Coluna) Central, na mesma razão das do “Rei do Mundo e seus dois Ministros Mahima e Mahinga”, por sinal que escritos também com a mesma letra “M”, que, em si, já é um mistério… Haja vista os termos Menfis-Misraim (e até Maisim para a terceira coluna) de certo rito egípcio hoje pouco conhecido…
Há quem afirme que a obra de Kunaton foi prematura e precipitada!
Nesse caso, também o foram as de Yezeus-Krishna (3.500 anos a.C.), a do mesmo Gautama, o Budha, a de Jeoshua (o Jesus bíblico) e outros mais, pois os homens con- tinuam tão perversos como o eram nas épocas em que os mesmos fizeram sua apari- ção no mundo.
Ademais, já o próprio Espírito de Verdade, que se manifesta pela Boca deste ou daquele Ser (grande ou pequeno, pouco importa), afirmava pela de Krishna, ao seu discípulo Arjuna (vide Bhagavad-Gita): “Todas as vezes, ó filho de Bhârata! que Dharma (a lei justa) declina, e Adharma (o contrário) se levanta, Eu Me manifesto para salvação dos bons e destruição dos maus. Para restabelecimento da Lei, Eu nasço em cada Yuga (idade)”.
Kunaton foi, pois – mais uma vez dizemos – a manifestação desse mesmo Espírito de Verdade, manifestado na Terra quando “os homens, insuflados pelos gananciosos sacerdotes de Amon, se achavam afastados de Dharma, a lei justa”, para não dizer, adulteravam a Verdade por Ele mesmo (Espírito de Verdade) impulsionada no começo das coisas. Ontem como hoje! Hoje como amanhã!
Até chegar o Grande Dia da Supe- ração final da Mônada. E como estamos atravessando uma época idêntica àquela, é muito natural que vultoso número de inconscientes prefira seguir o “Espírito das Trevas”, ou seja, o mesmo que em todos os ciclos de decadência, procura destruir a Obra do Bom Seme- ador.5
Do mesmo modo que outrora, Kunaton representava a Luz, e Tut-ank-Amon, a Sombra; nos dias atuais o fenômeno se reproduz de modo mais patente: de um lado, a Construção, a Obra do Bom Semeador; do outro, a Destruição, a obra da Ruína, da Miséria e de quantas perturbações atestam o declínio de um ciclo que desaparece no horizonte da evolução humana, para o dealbar de outro portador de melhores dias para o mundo.
E tudo isso, em obediência ao DESTRUENS ET CONSTRUENS! (…)
1 O Arcano 16 do Tarô equivale à Casa de Deus, do mesmo modo que “a idade do eterno adolescente ou das 16 primaveras”, como afirmam as escrituras orientais.
2 O Ureus mágico egípcio, ou seja, aquele que os faraós trazem na fronte, possui o mesmo sentido do “olho de Shiva” ou “3º Olho” das criaturas hindus, como símbolo da visão espiritual. Haja vista o sinal ou ponto existente na fronte de todas as imagens do referido país, a começar pela do Budha, das sacerdotisas etc., etc. Quanto ao “disco solar” possuir o referido olho internamente, a própria Igreja Católica chama de “Olho da Divina Providência” a idêntico (olho), colocado dentro de um triângulo quando não o faz com a figura de um ancião, a quem denomina de “Padre Eterno”.
3 O mesmo Conde de Cagliostro aparece na França “como Grão-Copta da Maçonaria egípcia”, por sinal que, trazendo no peito, pendente de sua faixa iniciática, um emblema onde figuravam as três iniciais “LPD”, que além de significar LILIUM PEDIBUS DESTRUERE (como prova a destruição da Flor de Lis francesa, através da Queda da Bastilha etc. ), a primeira dessas iniciais refere-se, ainda, à Fraternidade de LUXOR, do mesmo modo que a segunda, a PTAH e assim por diante.
4 Ao contrário do que afirmam os mais famosos egiptólogos, Kunaton teve oito filhas, verdadeiras Musas, para não dizer preciosos símbolos da constelação das Plêiades, na razão da esposa do rei Atlas e suas sete filhas, em perseguição das quais, segundo a mitologia grega, andava Órion que, por castigo, é, por sua vez, transformado em constelação ao lado de seu cão (Sírio). Equivale, ainda, às sete raças de que compõe uma Ronda por completo, além de que cada uma dessas sete Raças-Mãe possui as respectivas sete sub-raças. Nesse caso, sempre algo como origem para sete derivados, ou seja, a expressão numérica: OITO.
5 Para se avaliar, por exemplo, os processos postos em prática pelos sacerdotes de Amon, depois da morte de Kunaton, ou seja, quando o substituiu o mais do que maléfico faraó Tut-ank-Amon, transcrevemos aqui uma das muitas maneiras por que se descrevia o Egito depois da revolução religiosa: “O mundo era como no tempo do caos! Os bens dos deuses (deuses não possuem bens, dizemos nós, na razão de “Meu reino não é deste mundo”) foram aniquilados desde Elefantina até o Delta; seus santuários profanados do mesmo modo que os campos levados à ruína; as más ervas aí germinavam: os armazéns sofriam pilhagens por parte do povo (ainda bem que não era por parte do faraó! …) e os lugares perigosos se tornaram sagrados (não há como transformar o Mal em Bem, dizemos mais uma vez…). O mundo estava enxovalhado; os deuses fugiam abandonando os homens, por estes também os terem abandonado”. E assim por diante. Tão absurdas descrições alcançavam as raias da mentira e da falsidade, a começar pelo termo deuses, se era apenas a Aton que eles defendiam, para não dizer, a si mesmos, à sua usura, à ganância de governar, de serem, enfim, “mais realistas do que o rei”. Os eternos “vendilhões do Templo” a que se referia Jeoshua. Sim, pelo mercado vil que fazem das coisas divinas.
o – O – o