História, Memória e Patrimônio

Sítio das Almas

No século XVIII, a Ilha dos Valadares ainda era uma península conectada ao continente por um estreito istmo que separava o Rio da Vila (hoje Itiberê) do Rio dos Correias. ...

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No século XVIII, a Ilha dos Valadares ainda era uma península conectada ao continente por um estreito istmo que separava o Rio da Vila (hoje Itiberê) do Rio dos Correias. Os mineradores que buscavam ouro nas cabeceiras do Rio dos Almeidas enfrentavam dificuldades para acessar a vila, obrigados a um longo percurso até a foz e de volta à povoação. Para encurtar o trajeto, abriram o “corte do Cidrão”, um canal raso escavado com enxadas que permitia a passagem de canoas na maré cheia. Assim, a península tornou-se a ilha que conhecemos, habitada por pescadores e lavradores.

Entre os moradores destacava-se o padre Antônio Belém, proprietário de uma ampla fazenda com uma casa de pedra e pomares. Idoso e sem parentes próximos, o padre refletiu sobre o destino de seus bens após sua morte e teve uma ideia peculiar: nomear as Almas do Purgatório como herdeiras universais de sua propriedade. Contudo, no testamento, não explicou como os bens seriam destinados a esses herdeiros intangíveis. Talvez pensasse em criar uma renda para missas, mas a falta de detalhes tornou o documento confuso.

O caso chegou ao Ouvidor da Comarca, que concluiu que o testamento era inválido. As Almas do Purgatório não podiam ser reconhecidas como proprietárias, e o termo usado era ambíguo, sem definir número ou identidade dos herdeiros. Além disso, levantou-se uma curiosidade: como o padre já estaria morto no momento da execução, ele próprio poderia ser considerado herdeiro, o que causou perplexidade e algum humor.

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Após consultas ao Conselho Ultramarino em Portugal, o testamento foi anulado, e os bens confiscados pela Coroa. Os móveis foram leiloados, mas ninguém se interessou pelo terreno, conhecido como “Propriedade das Almas”. Superstições afugentavam os compradores, e o lugar foi abandonado, tomado pelo mato. No início do século XIX, a área foi usada como depósito de pólvora na guerra contra a Confederação das Províncias do Rio da Prata. Com o fim do conflito, em 1828, o local voltou ao abandono.

Relatos de assombrações surgiram. Moradores diziam que o fantasma do padre Belém vagava pelo terreno, lendo seu breviário. À noite, especialmente às sextas-feiras, eram vistos clarões misteriosos e ouvidos cantos sombrios. Até hoje, há quem acredite que as Almas visitam o lugar. Quem atravessa o terreno após o pôr do sol prefere companhia para afastar o medo.

Se, caro leitor, você avistar um vulto à noite, com uma lanterna, corra. Pode ser o padre em busca de “almas penadas”.

O SITIO DAS ALMAS  VIC NASC JR: Rev Pguá.

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Hamilton Ferreira Sampaio Júnior

Hamilton Ferreira Sampaio Júnior é pesquisador de história e genealogia, formado em Teologia e licenciado em História. Faz parte da Associação Brasileira de Pesquisadores de História e Genealogia e do Departamento Cultural do Club Litterario de Paranaguá, sendo também sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico de Paranaguá. Atua em projetos históricos de resgate de memória, livros comemorativos e biografias, além de projetos museológicos e pesquisas documentais para segunda cidadania. Seu mais recente trabalho foi o livro comemorativo dos 100 anos da Associação Comercial Agrícola e Industrial de Paranaguá.