Por: Kátia Muniz
“Mãe, como é que o cantor cabe dentro do rádio? Por onde ele entra? Como o artista, sendo uma única pessoa, consegue cantar no rádio e no programa de auditório da televisão ao mesmo tempo?”
“Mãe, quando se atende ao telefone, como é que se sabe se é homem ou mulher do outro lado da linha, se não dá para ver a pessoa?”
Meu pai trabalhava o dia todo fora. Sobrava para minha mãe resolver o imbróglio dos meus questionamentos e posicionamentos.
“Mãe, quando voltar da padaria, guarda o troco no cofrinho, senão a gente nunca vai ficar rico.”
“O que Papai Noel faz no restante do ano? Como o neném vai parar dentro da barriga da mulher? Por que minhas amigas têm irmãos e eu não tenho? Por que a visita vem de novo hoje se já veio ontem?”
Ao me levarem pela primeira vez numa cerimônia de casamento, quando o padre disse “Até que a morte os separe”, exclamei “Tudo isso!”, em voz alta. Aquele casal era novo à beça, e eles teriam de passar a vida toda juntos até que a tal morte os separasse? Era muito tempo. Convenhamos que eu raciocinei com coerência.
Era a década de 70, e não sei bem quantos anos eu tinha quando verbalizei essas pérolas, mas lembro como se fosse hoje.
O bom de ser criança é que tem sempre um adulto por perto disposto a sanar as nossas dúvidas mais inocentes ou a nos enrolar por um determinado período, ou melhor, até ganharmos maturidade para certos assuntos.
Fui crescendo, mas nem tudo me parecia muito claro ainda: “Mãe, tô sentindo um negócio esquisito aqui dentro, e isso só acontece quando vejo aquele garoto ali, ó”. Ao que minha mãe, prontamente, respondia: “É amor, minha filha!”.
Mãe é uma invenção fabulosa mesmo!
Então, tornei-me adulta e descobri que nessa fase a gente tem de se virar sozinha para tentar liquidar uma série de questionamentos, os quais se avolumam e ganham um nível maior de dificuldade na resolução das respostas: A felicidade é o quê? Devemos confiar na nossa intuição? É sempre bom ser racional? Por que sonhamos? Resolvemos agora ou deixamos para depois? Direito ou jornalismo?
Disseram que eu chorei muito ao nascer. Talvez fosse um choro de interrogações, como: Onde estou? Que lugar é esse?
Os questionamentos até hoje me fazem companhia e nem toda resposta me serve.