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Giordano Reinert

“Tem caroço neste angu”

Nossa língua portuguesa possui diversas expressões populares que se tornaram parte do nosso cotidiano e repertório, entretanto, na maioria das vezes, não…

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Nossa língua portuguesa possui diversas expressões populares que se tornaram parte do nosso cotidiano e repertório, entretanto, na maioria das vezes, não sabemos suas origens, apenas as replicamos naturalmente, como sempre tivessem existido. E, na realidade, muitas são oriundas de um lamentável e longo período da história brasileira, a escravidão.

O nosso país foi o que mais recebeu escravos no mundo, e o último país independente do continente americano a extinguir a escravidão. Razão pela qual, nossa cultura, religião, culinária, costumes, etc, foram muito influenciados, e são até hoje. Mas, o motivo da abordagem de hoje diz respeito às expressões populares criadas durante o período da escravidão no Brasil – uma época que faz parte de nosso passado, mas que possui ainda forte influência sobre nossa realidade atual, como: “tem caroço neste angu”, “meia tigela”, “nas coxas”, “espírito de porco”, e, “para inglês ver”.

Algumas, como as expressões “nas coxas” (trabalho malfeito, remetendo às telhas moldadas irregularmente nas coxas dos escravos), “tem caroço neste angu” (alguém escondendo algo, remetendo a um truque utilizado pelos escravos para se alimentarem melhor, carne ou torresmo escondidos no prato de angu de fubá), “meia tigela” (meia ração, como forma de punição ao trabalho medíocre), “espírito de porco” (embora sugestione sujeira e impureza, remete ao período escravocrata onde os escravos tinham receio de matar o animal e serem acompanhados pelo espírito do mesmo durante toda a vida), não são de difícil assimilação, entretanto, a expressão “para inglês ver”, é a que me trouxe maior curiosidade.    

E, como as outras, ela também tem sua origem na naquela época, e também no péssimo hábito brasileiro de aprovar leis que não “funcionam” (que ninguém cumpre e nem é punido por isso). Em 1830, a Inglaterra exigiu que o Brasil criasse um esforço para defenestrar o tráfico de escravos, e impusesse leis que coibissem tal prática. Na realidade o Brasil acatou a exigência inglesa, mas as autoridades daqui sabiam que tal lei simplesmente não seria cumprida – eram leis existentes somente em um papel “para inglês ver”. E, somente em 1.888, ou seja, depois de muito desgaste e muita injustiça social, que fora promulgada a Lei Áurea, que aboliu a escravatura definitivamente no Brasil.

E, passados tantos anos, nossa produção Legislativa do Congresso Nacional continua efetivamente “nas coxas”, “meia tigela”, e, “para inglês ver”, uma vez que, algumas das leis que nos regem, parecem ter sido elaboradas por “espíritos de porcos”, com todo respeito, aos  Congressistas. É totalmente inacreditável e lamentável a condição de penúria econômica e social vivenciada pela população brasileira. E, o pior, vão acabar com a Previdência, com a Consolidação das Leis Trabalhistas, e por aí vai… Não seria mais lógico, legislar no sentido de endurecer as penas para os delitos de corrupção, peculato, organização criminosa, e outros, além de transformarem os mesmos em crimes hediondos? Pois é, mas quando “tem caroço neste angu”, melhor não falar nada… Que Deus nos proteja!

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