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Endireitando

A influência política no impasse da reforma trabalhista

Se expirado o prazo sem o cumprimento do trâmite descrito acima, o Congresso Nacional deverá disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas dela decorrentes.

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No dia 23 de abril de 2018, expirou o prazo de vigência da Medida Provisória 808 (MP) que regulamentava, provisoriamente, 17 artigos da reforma trabalhista que havia entrado em vigor em novembro de 2017 (Lei n.º 13.467/2017). Tal fato ocorreu em razão das Medidas Provisórias terem um prazo de vigência delimitado de 60 dias, prorrogáveis uma vez por igual período. Antes que tal prazo finde, a MP deve ser convertida em lei, por meio de sua aprovação pelo Congresso Nacional. Isso não aconteceu.

O trâmite legislativo, disciplinado pelo artigo 62 da Constituição Federal de 1988, é o seguinte: quando a MP chega ao Congresso Nacional, é formada uma Comissão Mista (composta por deputados federais e senadores), responsável por aprovar um parecer sobre a MP. Com o relatório pronto, o texto deverá ser debatido e aprovado primeiro no plenário da Câmara dos Deputados e, posteriormente, no plenário do Senado Federal.

Se expirado o prazo sem o cumprimento do trâmite descrito acima, o Congresso Nacional deverá disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas dela decorrentes. Se não for editado o decreto legislativo em até 60 dias após a perda da eficácia da medida provisória, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência ainda serão regidos pela MP.

Isso significa que todos aqueles (patrões ou empregados) que se utilizaram dos dispositivos disciplinados pela MP durante o seu período de vigência, terão asseguradas suas prerrogativas. Entretanto, tais expedientes não mais poderão ser utilizados após o fim de seu período de vigência, o que ocorreu em 23 de abril. Assim, criam-se duas situações, fato que, de maneira geral, ocasiona insegurança jurídica.

Dentre as normas da reforma trabalhista, regulamentadas pela MP, destacam-se as seguintes: trabalho de gestantes e lactantes em locais insalubres; possibilidade do trabalhador autônomo ter contrato de exclusividade com determinada empresa; estipulação da quarentena de 18 meses para que trabalhador demitido se tornasse trabalhador intermitente; existência de multa de 50% para o trabalhador intermitente que descumprisse o contrato ou não fosse trabalhar quando convocado; negociação, por convenção ou acordo coletivo, da jornada de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso.

Ainda, eventuais indenizações por dano moral não estariam limitadas ao salário do trabalhador, mas determinadas em razão da gravidade da ofensa; a previdência do trabalhador intermitente que recebesse menos de um salário-mínimo deveria ser complementada por ele mesmo; a limitação dos prêmios pagos aos empregados a duas vezes ao ano e ao valor de 50% do salário mensal. Por fim, o artigo 2.º da MP 808 determinava que as regras da reforma trabalhista seriam válidas para todos os contratos vigentes. Agora, nenhuma dessas regras está mais vigente, o que permitirá que cada juiz ou tribunal analise a aplicação da reforma trabalhista de forma particular.

Em razão do desgaste político do Presidente Michel Temer (alvo de várias denúncias de corrupção), de estarmos em um ano eleitoral (o que exige a substituição de ministros – líderes políticos de bancadas) e da temática ser sensível a todos os brasileiros (fato que inibe uma atuação mais pungente por parte do Legislativo em determinados temas), nem mesmo o relator da referida Comissão Mista havia sido indicado. Além das razões descritas acima, o receio de que a análise dos congressistas desfigurasse a reforma trabalhista também foi um dos motivos que paralisaram as atividades (já havia mais de 900 emendas ao texto original da reforma).

O Executivo tem ciência de que tais questões não podem ficar como estão e nem a existência de duas regras distintas (uma válida durante a vigência da MP e outra após findo seu período de vigência) pode imperar. Para contornar a situação, pensa em alternativas para solucionar a celeuma, seja por meio de um decreto, de um novo projeto de lei ou de uma nova MP. Enquanto isso, o mercado financeiro sofre abalos em razão das incertezas (variação de índices relacionados à produtividade industrial), os empregadores não se sentem confortáveis em consolidar seus investimentos, aumentar a produção e ofertar novas vagas de trabalho e os trabalhadores engrossam as fileiras do desemprego e aumentam as atividades relacionadas à informalidade.

Diante dos fatos, que corroboram as relações precárias e determinadas por interesses entre o Legislativo e o Executivo, as mudanças necessárias ao desenvolvimento do país vão ficando em segundo plano e a dinâmica dos Poderes é estabelecida pelas eleições de outubro de 2018. Nesse cenário, a única certeza que temos é a de que, diante do “jogo do poder”, quem realmente sai perdendo é a sociedade, o país. Resta-nos, então, ouvir a opinião dos empregadores, dos trabalhadores, dos cidadãos, dos gestores públicos, dos que almejam ocupar cargos públicos nas próximas eleições. A todos nós, desejos de uma semana com mais segurança jurídica, melhores oportunidades de trabalho e renda e possibilidades de realizar investimentos seguros, sejam eles na produção ou no mercado financeiro, até a próxima quinta-feira.

Professor Dr. Bruno Gasparini – Coordenador do Curso de Direito do Instituto Superior do Litoral do Paraná (Isulpar), advogado, autor, palestrante, mestre em Direito das Relações Sociais, Doutor em Meio Ambiente e Desenvolvimento.

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