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Direito & Justiça

Mulher morta por PM aposentado é o primeiro caso de feminicídio do ano em Paranaguá

Segundo a delegada Maria Nysa Nanni, no primeiro inquérito policial já havia uma tentativa de atropelamento da mulher assassinada, entre outras situações

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No sábado, 20, foi registrado o primeiro caso de feminicídio de Paranaguá e o terceiro no litoral neste ano. O sargento aposentado da Polícia Militar, Sidnei da Rosa Silva, de 48 anos, matou a tiros a ex-esposa, Jocileine Siqueira, de 29 anos, no Jardim Figueira. Logo em seguida, Sidnei foi até a casa em que morava no bairro Porto dos Padres e cometeu suicídio com um tiro na cabeça. Os dois inquéritos relacionados a este caso foram encerrados devido à morte do policial.

A Polícia Civil ressaltou que o ex-marido teria ido até a casa de Jocilene e iniciado uma discussão. O Samu foi acionado, mas quando chegou ao local a vítima já estava em óbito. Familiares de Sidnei afirmaram que ele estava em depressão, agravada pelo consumo excessivo de álcool.

Feminicídio aconteceu no Jardim Figueira

MEDIDAS PROTETIVAS

A delegada do Núcleo de Proteção à Criança e ao Adolescente Vítimas de Crimes (Nucria) de Paranaguá, Maria Nysa Moreira Nanni, informou que a mulher tinha medida protetiva contra o companheiro. Ou seja, ele deveria manter distância dela. “Quando se coloca a vítima distante do agressor, ela fica mais segura. O que acontece é que não há efetividade porque socialmente ninguém ajuda a vítima a ficar longe do agressor”, declarou Maria Nysa.

No dia 8 de maio do ano passado, foi realizado o primeiro inquérito policial, levando-se em conta os crimes de ameaça e lesão corporal. Com isso, a polícia apreendeu a arma de fogo do sargento e realizou o levantamento do local onde ocorriam as agressões.

“Dentro da narrativa de agressão contra a vítima, também tinha intimidação de familiares. Depois disso, a vítima voltou a viver com o agressor. Neste primeiro inquérito há uma tentativa de atropelamento, entre outras situações”, disse a delegada.

No dia 23 de outubro de 2018 foi instaurado um novo inquérito policial devido a outra situação criminosa. “Neste segundo inquérito há também uma ameaça, envolvendo os filhos e outros familiares da vítima, além de lesão corporal contra ela”, afirmou Maria Nysa. Depois desse segundo episódio, a Justiça expediu novamente medidas protetivas que resultaram no afastamento do casal, tanto que na data do assassinato da esposa, ele estava em uma casa e ela em outra.

Ela ainda explicou o motivo de o sargento ainda não ter sido preso. “O ex-policial apresentava um quadro psiquiátrico um pouco complexo e ficou difícil a apreciação do pedido de prisão. Isso demanda a exposição de ofícios e o recebimento dessa resposta. A ideia é fazer uma adequação desse pedido, porque se ele está sob uma pressão psiquiátrica grave, ele pode ser tratado dentro da prisão, mas ele já apresentava tratamento. A gente ficava de mãos atadas sobre o que poderia se fazer. Além disso, havia medidas protetivas, a gente procurava dar orientações a Jocilene nas vezes em que ela veio à delegacia”, disse Maria Nysa.

Situação de Jocileine estava sendo acompanhada pela Polícia Civil, que já havia elaborado dois inquéritos, além de medida protetiva expedida pela Justiça

FALTA DE DELEGACIA ESPECIALIZADA

Paranaguá ainda não possui uma delegacia especializada para o atendimento à mulher, o que explica a demora na finalização dos inquéritos policiais. Nos últimos três meses, foram registrados, ao menos, 65 boletins de ocorrência no Nucria de Paranaguá.

Até pouco tempo atrás, o Nucria acumulava esta função junto com o atendimento a crianças e adolescentes. Agora, novas ocorrências de violência doméstica são tratadas pela 1.ª Subdivisão Policial de Paranaguá.

POLÍTICAS PÚBLICAS MAIS EFICAZES

Esse foi um caso de feminicídio acompanhado desde o início das agressões de violência doméstica pela delegada que atua em Paranaguá.“A gente sabe que o resultado foi trágico. Particularmente, fico chocada porque todo o período da minha carreira nunca atendi um caso de feminicídio desde a violência doméstica. Todas as vezes que consegui atender a violência doméstica, a mulher assimilava a orientação e havia políticas públicas de defesa da mulher, tratadas fora do âmbito policial. Hoje, não temos esse tipo de acolhimento”, lamentou a delegada.

Vale ressaltar que a Lei Maria da Penha aborda a questão da mulher, mas também considera o tratamento ao agressor. O sargento do caso em questão passava por acompanhamento psicológico.

“O agressor precisa ser tratado e isso não vem acontecendo sistematicamente. Ele pode até se afastar da primeira vítima, mas ele vai fazer uma segunda e esse não é o objetivo da Lei Maria da Penha, que prevê uma pacificação social. Enquanto isso, vamos ver cada vez mais casos de feminicídios”, explicou Maria Nysa.

Apesar das punições que devem ser realizadas com base na legislação aos agressores, o tratamento é fundamental para a mudança social que a Lei Maria da Penha propõe. “Ele também precisa ser atendido porque não vai deixar de existir na sociedade, mesmo que tenha uma pena, não vai evaporar do convívio social. Sem o devido tratamento, o crime pode ser pior. A pena em si é somente uma resposta no âmbito criminal, ela é insuficiente para analisar a complexidade dos problemas dentro da família”, ressaltou a delegada.

EMPODERAMENTO FEMININO

“O discurso social precisa ser de empoderamento da mulher. Já passou do tempo das mulheres dizerem que são feministas. O feminismo hoje é questão de sobrevivência. Antes de ter uma família, a mulher precisa pensar em cuidar dela mesma, em estudar, de cuidar da sua vida, sem depender de um homem que eventualmente será meu agressor”, finalizou a delegada.

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